Revista de Medicina Desportiva Informa Setembro 2016 | Page 5
O que andamos a ler
Introdução
Prof. Doutor
Ovídio Costa
Cardiologista. Faculdade de
Medicina do Porto
Left Ventricular Non-Compaction
in Athletes: To Play or Not to Play
Coris EE, Moran BK, De Cuba R, Farrar T, Curtis AB.
Sports Med. 2016;Mar 22
Dr. António Freitas
Cardiologista.
Centro de Medicina
Desportiva de Lisboa;
Serviço de Cardiologia,
Hospital Fernando Fonseca
Comentário
Trata-se de um excelente artigo de
revisão, escrito numa perspectiva
clínica abrangente, da etiopatogenia ás manifestações clinicas, em
diferentes contextos, incluíndo uma
refleção crítica sobre a adequação
dos atuais critérios de diagnóstico
de Não Compactação do Ventrículo
Esquerdo (NCVE).
No que se refere à população de
atletas, o artigo destaca especialmente três referências da literatura
recente:
• A revisão de Ganga e Thompson, que
incide sobre 18 casos clínicos de
atletas, selecionados a partir da
literatura com o diagnóstico de
NCVE, naturalmente com elevada
prevalência de eventos cardiovasculares, podendo corresponder a
Nesta rubrica recomendamos dois artigos que abordam temas muito interessantes. O primeiro na área da avaliação médico-desportiva.
Na avaliação clínica de desportistas aparentemente saudáveis, a presença
de achados nos exames complementares é uma das maiores dificuldades
que o médico encontra para a decisão de aptidão. A distinção entre hipertrabeculação secundária ao treino físico e a “verdadeira” Não Compactação
do Ventrículo Esquerdo é um bom exemplo do que dissemos. O segundo
artigo destaca, de uma maneira exemplar, a necessidade de se considerar
a realização de testes genéticos uma prática padrão em todas as situações
de morte súbita inexplicada, também designada morte elétrica. A autópsia
molecular pode permitir esclarecer este evento numa percentagem muito
significativa destes casos e evitar a sua repetição nos familiares ainda vivos.
“verdadeiros” casos de patologia
cardíaca;
• Os trabalhos de Gati e Sharma, que
sugerem a possibilidade de desenvolvimento de hipertrabeculação
adaptativa, secundária ao exercício
e ao treino físico, propõem uma
estratégia de avaliação e decisão
para a prática desportiva baseada,
não apenas nos critérios de diagnóstico imagiológico, mas também
na valorização mandatória de
outros parâmetros, como as dimensões e função ventricular esquerda
(FVE), a presença de alterações da
repolarização ventrícular (ARV) e,
naturalmente, sintomas e/ou história familiar de doença cardíaca ou
de morte súbita prematura;
• Mais recentemente, Maron e colab,
na Task Force de miocardopatias (2015),
em referência explícita à NCVE,
sugerem uma atitude prudente
quando se trata de atletas que
apenas preenchem critérios morfológicos, não apresentando qualquer
outra alteração concomitante.
De salientar a preocupação de
evitar “rótulos” diagnósticos com
conotação patológica e, simultaneamente, reforçar a necessidade
de seguimento e monitorização
das dimensões e FVE, bem como o
desenvolvimento de ARVs ou sintomas “de novo”. De facto, a utilização cada vez mais frequente dos
métodos de imagem na avaliação do
atleta, nomeadamente a ecocardiografia, tem conduzido ao aumento
do número de casos diagnosticados
como NCVE, colocando problemas
delicados quanto à orientação clínica e decisão médico-desportiva.
O que se aguarda “ansiosamente”
é a revisão dos atuais critérios de
diagnóstico para a NCVE, particularmente em populações “especiais”
como a dos atletas, que não poderão
ter por base critérios exclusivamente morfológicos / imagiológicos.
Possivelmente, e à semelhança do
que acontece com outras miocardiopatias, não havendo um gold
standard diagnóstico, só a conjugação
de vários critérios clínicos (agrupados em major e minor) e diferentes
categorias de diagnóstico (definitivo, borderline e provável) evitará
o sobrediagnóstico e as suas consequências nefastas.
Na minha opinião pessoal,
enquanto não tivermos critérios,
com sensibilidade e especificidade
aceitáveis para o diagnóstico de
NCVE, deverá ser utilizada a expressão de hipertrabeculação isolada,
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