Revista de Medicina Desportiva Informa Setembro 2012 | Page 6
decorriam. No dia do seu funeral as
lojas do comércio fecharam e foram
necessários 4 carros para transportar as flores. Tudo parou. O herói, a
referência nacional estava morto.
Não chegou a ver a filha que nasceria
meses depois.
Mais intervenções se sucederam,
com algum entusiasmo, mas menos
conseguidas. Defendeu-se uma tese
de causa de morte, mas a hiponatrémia, com base nas circunstancias
do acidente, não é defensável. Nem
o atleta ingeriu muita água simples (sem sódio), nem houve perda
excessiva de sódio pela pele, já que
os poros estavam entupidos pela
camada isoladora de unto. Por outro
lado, a hiponatremia ocorre tipicamente nos atletas mais lentos, que
não era o caso do “foguetão” Lázaro.
A causa cardíaca é uma hipótese
também remota, mesmo considerando que era um atleta de 24 anos,
dada a plausibilidade de outra causa:
o choque térmico. Vários fatores
se conjugam para este diagnóstico: temperatura ambiente = 32°C
(desconhece-se o valor da humidade
relativa, mas naquela localização
geográfica poderia ser elevada) e a
impossibilidade de funcionamento do
mecanismo de sudação-evaporação
(poros entupidos), o qual é o principal
mecanismo de termorregulação neste
contexto. As alterações do estado de
consciência e as convulsões fazem
parte do quadro clínico e terão levado
a que os médicos suecos diagnosticassem (erradamente) uma meningite. A encefalopatia causada pela
hipertermia causou aqueles sinais.
O próprio médico que o socorreu
ter-se-á apercebido do excesso de
calor corporal e aplicou-lhe gelo
na cabeça, pois as queixas eram de
origem cerebral. A definição desta
causa é importante e é pedagógica
para todos os praticantes desportivos.
Também é de excluir totalmente a
ingestão de substâncias perigosas,
como era habitual com a estricnina,
pois não é sério e/ou justo afirmá-lo,
não há provas, e a causa aqui referida
foi (infelizmente) mais que suficiente
para causar a morte.
O Prof Jorge Silvério, especialista
em Psicologia desportiva, da Universidade do Minho, com muitos anos
de experiência, centrou a intervenção
em torno da palavra TENACIDADE
como conceito central. Referiu vários
aspetos que condicionam o sucesso
nas provas, o 1.º dos quais foram os
acontecimentos de vida. A gravidez
da mulher era um acontecimento
positivo. No caso do maratonista
Carlos Lopes, que fora atropelado,
teve um acontecimento de vida
negativo, mas, mesmo assim, ganhou
a medalha de ouro. Falou da carga
de treino, da análise dos adversários,
da influência da comunicação social,
das lesões e da dor, do espírito de
equipa, dos ritmos biológicos, das
condições ambientais, etc. Enfim, não
é fácil ser um atleta campeão. Este
surge por seleção natural, produto
de uma genética favorável, que o
ambiente (clube, diretor, terapeutas,
nutricionista, psicólogo, médico, etc.),
coordenado por um treinador, transforma, evolui e ganha. Mas o herói
é o atleta que sofre, que se deita
cedo e percorre centenas de kms por
semana. Não é mais ninguém, como
foi defendido nessa tertúlia.
Foi uma homenagem (evocação,
nas palavras do Sr. Comandante
Vicente de Moura) singela, justa e
oportuna. Foi há 100 anos. A família
presente ter-se-á sentido satisfeita
por esta manifestação de gratidão. No
final, o Dr. Alexandre Mestre agradeceu a sua presença, referiu que outras
tertúlias surgirão naquele local,
naquela biblioteca que se pretende
viva e ensinadora. Após muitos anos
de promessas parece que temos a
sorte de ter um Secretário de Estado
que discretamente, mas com eficácia, com dificuldade, mas que não
desanima, vai fazendo as reformas
para que o desporto e a medicina a
ele ligado se potencializem. BR.
Bota de Ouro do Eusébio
Fachos olímpicos
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