Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2020 | Page 21
estavam agora a deixá-lo para trás
mesmo em subidas modestas”.
Fármacos e métodos
A Agência Mundial Antidopagem
(AMA) enquadra os métodos e
fármacos usados para dopagem sanguínea
em duas secções da lista de
substâncias proibidas: M1 (Manipulação
de sangue e componentes do
sangue) e S2 (Hormonas peptídicas,
Fatores de crescimento, Substâncias
relacionadas e miméticos).
Transfusões de sangue (M1)
As transfusões de produtos hemáticos
representam a forma mais
arcaica de aumentar a quantidade
de hemoglobina no sangue
(Figura 2). Foram muito populares
entre atletas de endurance durante
as décadas de 70 e 80, tornando-se
proibidas apenas em 1985. As alternativas
farmacológicas entretanto
desenvolvidas levaram a que fossem
preteridas durante a década de 90
e na 1ª metade da década 2000–10,
regressando em força a partir dai. A
Operação Puerto realizada em 2006,
que envolveu ciclistas espanhóis de
classe mundial, atesta isso mesmo.
As transfusões podem ser autólogas
ou homólogas. A prática mais
comum consiste em colher 500 a
1500ml de sangue, tratá-lo com
conservantes e anticoagulantes e de
seguida armazená-lo. Este processo
pode ser feito com recurso à refrigeração
a 4°C ou ao congelamento a
Treino em altitude
Transfusões de sangue
HBOCs
PFCs
Epoetinas α,β,ω δ
Darbepoietina α
CERA
Epoetinas biossimilares
EPO mimetics
EPO fusion proteins
EPO fusion molecules
Aumento da massa eritrocitária
Aumento da massa total de Hb
Aumento do conteúdo sanguíneo de O2
– 80°C. O congelamento permite que
o sangue seja armazenado durante
10 ou mais anos. No entanto, este
processo implica equipamento
especial, disponível num número
reduzido de locais. Por sua vez, a
refrigeração a 4°C permite o armazenamento
do sangue durante um
período máximo de 42 dias. Há, no
entanto, evidência de que a degradação
do produto (decorrente da
hemólise) se inicia a partir da 3ª
semana.
As transfusões autólogas colocam
alguns desafios especiais. Após a
colheita de sangue o atleta sofrerá
uma inevitável quebra do rendimento
– em condições normais um
individuo saudável necessita de 36
dias para recuperar de uma perda
de 500ml de sangue. Tal obriga a
que atleta e staff façam uma cuidadosa
gestão dos timings de colheita
e reinfusão (podem ser múltiplas),
ajustados ao plano de treinos e
competição.
Apesar dos esforços nesse sentido,
não foi ainda possível introduzir um
teste analítico para identificar casos
de transfusão autóloga. Atualmente,
a deteção destes casos é apenas
possível por métodos indiretos (ver
última secção). No que respeita
às transfusões homólogas, desde
2004 que as diferenças ao nível
dos antigénios de grupo sanguíneo
secundários (para além dos sistemas
AB0 e Rh) entre dador e recetor são
passíveis de ser identificadas por
métodos diretos. A presença de uma
população celular mista indica que o
indivíduo testado recebeu sangue de
um dador.
Estímulo eritropoiese
Estabilizadores do HIF
Inibidores da GATA
Modificadores alostéricos da Hb
Aumento da oferta de O2 ao tecido muscular
Aumento do VO2max
Figura 1 – Possíveis alvos para as estratégias usadas na dopagem sanguínea
Terapia genética
Eritropoietina e agentes que afetam
a eritropoiese (S2)
1. Eritropoietinas
O desenvolvimento da eritropoietina
(EPO) foi uma das maiores descobertas
da indústria farmacêutica nas
últimas décadas. A sua comercialização
teve início no final da década
de 80, havendo evidência que a sua
utilização por atletas para fins não-
-terapêuticos começou pouco depois
(Quadro). Tinha a grande vantagem
de permitir ganhos de performance
comparáveis aos obtidos com as
transfusões, evitando os problemas
logísticos a estas associados. 4
A eritropoietina é uma hormona
secretada pelo rim que regula a
quantidade de eritrócitos no sangue.
Em condições de hipóxia tecidular
promove a maturação e proliferação
dos precursores dos eritrócitos,
aumentando assim a massa global
de Hb e a capacidade de transporte
de O 2
para os tecidos.
Existem atualmente três gerações
de eritropoietina no mercado: a
rHuEPO (1ª geração), a darbopoetina
(2ª geração) e a CERA (3ª geração). O
desenvolvimento nesta área permitiu
que se passasse de uma semivida
plasmática de 8,5h (rHuEPO) para
25,3h e 142h, diminuindo a frequência
de administração necessária (de
3x/semana para 1x/semana e para
1x/cada 2 semanas).
Os efeitos adversos da sua utilização
incluem, a curto prazo, reações
no local da picada, náuseas, cefaleias,
artralgias e reações anafiláticas. 9 A
médio-longo prazo é o incremento
da viscosidade sanguínea que pode
aumentar o risco de eventos trombo-
-embólicos. O aumento das necessidades
de ferro para a síntese de
Hb eleva o risco de ferropenia, caso
não se proceda ao aumento do seu
aporte. Por outro lado, a necessária
suplementação em ferro tem conduzido
a alguns casos de sobrecarga
grave. 4
A deteção é feita com recurso a
métodos diretos ou indiretos. No
que respeita aos primeiros, importa
referir que a curta janela de deteção
de alguns destes fármacos faz com
que o momento do teste em relação
à administração seja decisivo.
2. Agonistas do recetor da EPO
Diferentes proteínas com afinidade
para o recetor da EPO têm sido
Revista de Medicina Desportiva informa maio 2020· 19