Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2020 | Page 27
Rev. Medicina Desportiva informa, 2020; 11(1):25-27. https://doi.org/10.23911/clinica_dragao_2020_1
Prevenção da Lesão dos
Músculos Isquiotibiais
Dr. Nuno Cerdeira 1,2 , Dr. Renato Andrade 2-4 , Dr. Ricardo Vidal 2,3,5 , Dr. Rogério Pereira 2-4,6 , Prof. Doutor João
Espregueira-Mendes 1-3,7-9
1
Futebol Clube do Porto; 2 Clínica do Dragão, Espregueira-Mendes Sports Centre – FIFA Medical Centre of
Excellence, Porto; 3 Dom Henrique Research Centre, Porto; 4 Faculdade de Desporto da Universidade do Porto;
5
Futebol Clube Paços de Ferreira, Paços de Ferreira; 6 Escola Superior de Saúde, Universidade Fernando Pessoa,
Porto; 7 ICVS/3B’s–PT Government Associate Laboratory, Braga/Guimarães; 8 3B’s Research Group, Guimarães;
9
Escola de Medicina, Universidade do Minho, Braga. Portugal.
RESUMO / ABSTRACT
As lesões musculares são as mais frequentes em desportos como o futebol profissional e o
running. Os isquiotibiais são os músculos mais afetados por lesões primárias e recidivas. A epi-
demiologia, vários fatores de risco e mecanismos de lesão são conhecidos, assim como medidas
preventivas eficazes. Estas são sobretudo baseadas em estratégias de fortalecimento e controlo
motor, com incidência em exercícios de fortalecimento de natureza excêntrica. Há evidência
inequívoca a favor do Nordic hamstring exercise (NHE) em programas de prevenção. A aparente
familiarização generalizada com o NHE e a taxa de implementação é paradoxal. A aderência e
compliance são determinantes.
Muscle injuries are the most frequent in sports as professional football and running. Hamstrings are the
muscles most affected by primary lesions and recurrences. Epidemiology, various risk factors and mecha-
nisms of injury are known as well as effective preventive measures. These are mainly based on strategies
for strengthening and motor control, with a particular focus in eccentric strengthening exercises. There is
unequivocal evidence in favor of implementing Nordic hamstring exercise (NHE) in prevention pro-
grams. The apparent generalized familiarization with the NHE and the implementation rate is paradoxi-
cal. Adherence and compliance are determinant.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Lesões musculares, isquiotibiais, prevenção, exercício excêntrico
Muscle Injuries, hamstrings, prevention, eccentric exercise
Epidemiologia
A lesão dos músculos isquiotibiais é
a lesão mais comum entre futebolis-
tas profissionais e outros desportis-
tas. 1-8 Esta lesão representa cerca de
39% de todas as lesões musculares
desportivas e são mais frequentes
em competição do que em treino. 9-11
No futebol profissional as lesões
musculares dos isquiotibiais envol-
vem o bicípite femoral em 84% dos
casos, 11% o semitendinoso e 5%
o semimembranoso. 12 Uma equipa
com 25 jogadores terá uma média
de 15 lesões musculares por época,
representando mais de 25% do
tempo de ausência em treino e jogos,
representando entre 20% a 37% do
tempo de indisponibilidade para a
prática em profissionais do género
masculino. 10 O tempo de recupera-
ção varia com o tipo de lesão mus-
cular e está compreendido entre 17 e
90 dias. 7,13 Entre 12% a 63% dos indi-
víduos recidivam. 1,7,12-14 A maioria
das recidivas parece afetar o bicípite
femoral e ocorre no primeiro mês
após o regresso à competição. 12,15-17
Estas lesões para além de pode-
rem comprometer o desempenho do
atleta 4 , resultam em elevados custos
financeiros, especialmente quando
são jogadores profissionais de alta
competição (na ordem dos 280 000 €
por lesão). 5
Mecanismo de lesão
A lesão dos isquiotibiais é mais
comum no género masculino 18 e em
desportos que incluem sprint e movi-
mentos de alta velocidade com fle-
xão da coxa e extensão do joelho. 19,20
Em corrida, acontecem frequente-
mente na última fase de balanço
e do sprint, que requer tilt pélvico
anterior e uma ação de alongamento
concomitante com co-contração dos
músculos isquiotibiais para a desa-
celeração e preparação do contacto
do pé com o solo. 9,21
Fatores de risco
Os fatores de risco podem ser extrín-
secos e intrínsecos, modificáveis
e não modificáveis. Exemplos de
fatores de risco não-modificáveis são
a idade, sexo, grupo populacional e
lesão prévia. 22 Entre os modificáveis
estão a diminuição do comprimento
muscular, défices de força muscular,
fraqueza/instabilidade do core, carga
de treino, ativação desadequada,
anteversão da pélvis, patologia da
lombar, fadiga e aumento da tensão
neural. 1,19,23,24 A carga de treino tem
sido estudada nos últimos anos e
tem sido sugerido que atua como
um “veículo” que tanto pode prote-
ger como predispor atletas a lesão. 25
Estratégias efetivas para prevenção
Ao longo da última década, um
número crescente de estudos
defende que o treino de força, parti-
cularmente através de sobrecargas
excêntricas e/ou em grandes ampli-
tudes musculares, reduz significati-
vamente o risco de lesão primária e
secundária nos isquiotibiais. 26-30 No
entanto, a dosagem ideal dos progra-
mas de treino excêntrico ainda não
está bem clarificada. 30
O exercício excêntrico intitulado
de Nordic hamstring exercise (NHE)
tem sido destacado como uma
medida preventiva eficaz de lesão
dos isquiotibiais. Uma revisão
sistemática e meta-análise recente
que abrangeu 8459 atletas de várias
faixas etárias e praticantes de dife-
rentes desportos 31 mostrou que este
exercício reduz para metade a inci-
dência de lesões dos isquiotibiais.
Outros estudos mostram a eficácia
de exercícios de grande amplitude
articular na prevenção da recidiva
e num retorno precoce à competi-
ção. 27,28 Num estudo randomizado 32
foi reportado o benefício de um
protocolo cujos exercícios exploram
a extensibilidade máxima muscular
(L-protocol de Askling: Diver, Extender
e Glider). Estes protocolos devem ser
implementados no contexto da rea-
bilitação e da prevenção secundária
de lesões dos isquiotibiais.
O desenvolvimento da musculatura
do core também deve ser trabalhado.
Muitas das lesões dos isquiotibiais
ocorrem com flexão do tronco e
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