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Miguel conta que as biografias, por mais que não sejam suas favoritas, trouxeram boas experiências para ele. “Já trabalhei com biografia quando fiz o documentário do Tranquilino Gazuza, que fala sobre a vida de um dos líderes aqui de Diadema.” Ao lon- go da conversa, revela que suas favoritas são os contos ficcionais, por sentir que tem mais liber- dade para contar as histórias. Um de seus grandes destaques de ficção é o curta “Krusmanta”, que con- ta a história do irmão de Jesus quando foi enviado ao planeta Krusmanta, simultaneamente à vinda de Jesus para a Terra. A alcunha Krusmanta se tornou também o nome de seu próprio Cineclube, sua oficina de cinema. “Na época esse foi considerado o melhor Cineclube do Brasil, acredita?”, afirma satisfeito. Outra grande parte que se mostra laten- te na vida de Miguel é sua veia de escritor. Possui muito apreço pelos seus escritos, falan- do sobre eles com muito carinho. Ele tem cor- déis “mais duros”, como “O inverso da inquisi- ção”, que aborda temas mais polêmicos de agressões e fatos sobre a inquisição e religião. Mas tem também cordéis como o “A glória do cinema cabe a quem?”, citado no início da reportagem, con- tando detalhadamente toda a história do cinema. Sem muito espanto, Miguel foi o cordelista vencedor da Mostra de Arte de Diadema, em 2003, com os cor- déis “A praça da moça”, ponto turístico localizado no coração de Diadema e “Moço puro, moça impura”. Ao longo de sua vida, Miguel produziu e disse- minou cultura por onde passou, sem ganhar nada em troca. “Uma única vez ganhei um financiamento do Ministério da Cultura pra fazer um filme. Mas não 24 sobrou nada, usamos todo o dinheiro com passagem, câmeras que não tínhamos… pelo menos nos ren- deu o primeiro lugar aqui em Diadema.”, relembra. A falta de reconhecimento não foi sua única barreira. “Nunca tive muito apoio da minha famí- lia. Eles não entendem bem o que eu faço, acham que eu só quero pedir dinheiro”. Conta também que o preconceito se fez presente em toda sua caminha- da. Ao representar frações muito divergentes da sociedade, o pedreiro cineasta sempre lidou com os olhares duvidosos e com a descrença. “Quan- do eu estou sujo de cimento, ninguém acredita que eu sou cineasta. Aí eu conto e acham que eu sou louco! Mas isso nunca conseguiu me parar.”. Com muitos altos e baixos, por vezes Mi- guel acha refúgio nos livros. Encontramos de tudo em sua estante: Nietzsche, Schopenhauer, Goe- the e Sartre - geralmente em sua versão origi- nal. “Se tivesse que escolher um só, ficaria com Sartre. É meu favorito, ele fala muito das an- gústias e dos grandes desamparos dos homens.”. Miguel Batista transpira jovialidade e tem mui- tos planos pela frente. “Estou fazendo com a mi- nha sobrinha meu próximo curta. Ele é baseado num cordel que eu escrevi e que conta a história da família Timóteo, lá de Limoeiro.”. Num bate-papo não tão longo, Miguel demonstra carregar consigo todos os anseios de sua juventude - e vários adi- cionais. “Eu tenho medo de realizar todos os meus sonhos e a vida perder o sentido. Então a gente vai indo assim, realizando e encontrando sempre mais coisa pra sonhar.”. A