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der nenhum dos questionamentos e segue fazendo questionamentos indelicados. Esse quadro, na verdade, representa uma pessoa que quer ajudar, mas que mesmo assim não tolera e não ouve as necessidades do outro. Um dos intuitos do espetácu- lo é provocar uma certa reflexão nas pessoas. Existem vários ní- veis de transfobia, machismo e racismo que muitas vezes passam despercebidos, porque não estão ligados a violência bruta. As- sim, as artistas aproveitam o potencial da drag de transformar tudo em uma grande piada, mas colocam o dedo na ferida: “ Se você cria uma cena que de forma sutil está dizendo isso, aí você começa a rir, e depois rir de nervoso e depois começa a pensar ‘será que faço isso? será que já fiz?’. Acho que só nesse espaço que dá para desarmar sua defesa para você receber a mensagem.” Como o grupo dividiu o qua- dro em duas partes, essa cena do Talk Show ocorre tanto com Geni, abordando o tema do racismo, quanto com Maldita sobre o tema transfobia. Nessa apresentação em particular, o enfoque esteve em Maldita, que logo depois teve um momento a sós com a platéia. Todas se retiraram, a mulher se sentou no chão do palco e come- çou a conversar abertamente so- bre as dificuldades do seu dia a dia: “Você não tem o direito de se incomodar, não tem o direito de ser alguém… porque no fundo a gente nunca é alguém, é só um pedaço de carne que serve pro exotismo.” Além dessa temática, a homo- fobia também é questionada. A personagem Lyra, conhecida por ser a fadinha misteriosa de ou- tra dimensão, canta uma canção bem elaborada sobre os estereó- tipos que circulam o mundo LGBT. Lyra na vida real é pansexual e conta na música como se apai- xonou por uma garota da terra, mas explica que isso não quer dizer que ela gosta apenas de garotas. Outro ponto abordado nesse quadro são os substantivos usados na descrição das mulhe- res não heteras, como: sapatão, caminhoneira, machinha e muitos outros termos. Depois da cativante apresen- tação de Lyra, Geni dá uma des- contraída na platéia com um jogo de bingo, mas demonstra que o espetáculo está chegando ao fim. Assim, as considerações finais da artista foram contando um pouco da história de como chegaram até ali, além de abrir seu coração, dizendo que montar sua Drag foi o que fez ela encontrar seu lu- gar de fala e agora já sabe qual é, não vai se deixar calar: “Não existe mais Ministério da Cultura e a cada dia a Arte como um todo permanece em um lugar de resistência. Por mais que fechem espaços, nós va- mos continuar abrindo mais, e qualquer espaço vai ser espaço, qualquer palco vai ser palco, mas a nossa Arte vai continuar. Esse governo vai passar e a Arte vai continuar”. A 21