Relatório da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2015 | Page 43

42 | RELATÓRIO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA DA ALERJ | 2015 Não são só as lembranças de dona Fátima e a colônia de pesca que estão sendo engolidas. Todas as oito comunidades do bairro do Caju estão sendo devoradas aos poucos pelo abandono do poder público. CDDHC: Quando a senhora veio morar no Caju e qual sua lembrança mais antiga? Maria de Fátima: Eu cheguei aqui com nove anos. Estou com 52. Na verdade, eu morava perto do Caju, lá para os lados dos bombeiros. Tinham 16 barracos e eu vim morar com minha avó. Fiquei ali até meus 12 anos. Aí minha mãe veio para o Rio, alugou um barraco e fomos morar juntas. Moramos no 950 (favela dentro do Caju). Vim para cá (Parque São Sebastião) com 15 anos e fiquei. Teve uma chuva aqui que não me sai da memória. Choveu gelo, muito gelo. E a gente que morava em barraco... Meu avô colocou a gente dentro do guarda-roupa. As telhas quebraram. O Caju alagou. Aliás, o Caju sempre alaga. Nós ficamos sem luz. Foi um caos. Lembro da colônia de pescadores. Nós ganhávamos peixe. Eles vinham com as cumbucas cheias de peixe e distribuíam para a gente. As coisas eram precárias, mas o Caju não tinha tanta poluição como agora. Tinha mais espaço, mais liberdade. Depois foi crescendo. Empresa para lá, empresa para cá. Elas foram destruindo o que tinha de mais rico no Caju: a colônia de pescadores. Isso aí foi a pior coisa que pode acontecer. CDDHC: Além da poluição, há problemas graves de saúde e saneamento básico no Caju. Maria de Fátima: O Caju cresceu na população. A gente sabe pelas eleições que só de eleitores temos 40 mil. Isso só quem votou. Tem muito mais gente. Existem oito comunidades aqui, elas cresceram para cima. Minha comunidade tem 12 mil habitantes, foi a primeira do Programa Favela Bairro. A demanda na época, há 20 anos, era de 7 mil habitantes. Agora são 12 mil. Esgoto e água são nossas dificuldades. O posto de saúde era bem precário, mas atendia a demanda. Agora, o responsável pelo posto conseguiu trazer mais coisas. Hoje temos sete equipes no Caju, mas, te pergunto, você acha que é louvável sete equipes para atender 60 mil habitantes? Precário, né? Sem contar que vem pessoas de outros lugares. Pediatra, ginecologista, ortopedista, dermatologista são coisas que fazem falta. CDDHC: Durante o Ocupa DH, um dos principais problemas mencionados pelos moradores é o abastecimento e a qualidade da água. Maria de Fátima: Há uns três anos tínhamos um morador aqui que ajudava a limpar a caixa d´água. Ele fazia essa limpeza, mas dizia que o reservatório precisava de manutenção porque estava com infiltração. Já veio equipe da Cedae aqui. Eles tiram foto, fazem levantamento, diz que vai fazer e acontecer...