Relatório anual da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2014 | Page 55
Em audiência pública realizada pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj, no dia 13 de março de 2014,
outros casos semelhantes foram apresentados, evidenciando uma questão estrutural
no sistema de justiça criminal do Estado.
Douglas de Oliveira Moreira, presente na
audiência, foi acusado de participar do roubo de um automóvel em julho de 2013,
em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
Segundo as informações colhidas por seus
familiares na Delegacia, a polícia chegou
até Douglas através das redes sociais, investigando um de seus “amigos”, denunciado
como receptador de peças de automóveis
roubados.
Douglas foi preso em sua residência por volta de cinco horas da manhã do dia 09 de
janeiro de 2014, tendo inclusive seus pertences quebrados pela polícia no momento
de sua prisão. A ocorrência foi registrada
na 58ª DP, em Comendador Soares, e, após
prestar depoimento pelo qual negou as
acusações, Douglas foi encaminhado para
o sistema penitenciário. Procurada por seus
familiares, a CDDHC solicitou à Federação
das Empresas de Transportes de Passageiros
do Estado do Rio de Janeiro (FETRANSPOR)
informações sobre a utilização do Bilhete
Único na data do crime em questão, dado
que indicou a localização e horário de Douglas no momento do fato; o mesmo estava dentro de um ônibus, a mais de quinze
quilômetros de distância do roubo do carro.
Apesar dessa informação, após permanecer
preso por um mês, Douglas está em liberdade provisória e ainda responde à ação
penal.
Enquanto isso, Hércules Menezes Santos ainda está preso pelo mesmo crime
imputado a Douglas, mesmo depois da
identificação e prisão da quadrilha que
roubava carros na região e constatação
da semelhança com um dos integrantes
do grupo. Cabe destacar que o receptador preso afirmou não conhecer Hércules
e seus familiares depuseram informando
que estavam com o mesmo em casa na
hora do crime, o que não foi levado em
consideração. Apesar dos esforços da Comissão de Igualdade Racial da OAB/RJ,
de seu advogado e da CDDHC, Hércules
ainda aguarda julgamento preso desde janeiro de 2014 por roubo de carro, mesmo
não sabendo dirigir.
Ao olhar os casos aqui narrados fica patente que há uma inversão do ônus da
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prova. A prisão aparentemente elimina
a necessidade de investigação, passando
a ser a prisão a resposta à sociedade daquilo que tememos. Ela culturalmente elimina a necessidade de investigação. Essa
constatação fica mais evidente ao analisar
os casos de prisão provisória no Estado do
Rio de Janeiro.
Também presente na audiência, o pesquisador Ignácio Cano apresentou o resultado de uma pesquisa realizada ao longo de
2013 sobre a avaliação da aplicação da Lei
nº 12.403, de 2011, na prisão provisória no
Rio de Janeiro, realizada pelo CESeC, Centro de Estudo de Segurança e Cidadania, da
Cândido Mendes.
A Lei nº 12.403, de 2011, chamada lei das
medidas cautelares, abre para o Judiciário
um grande leque de alternativas. Entre essas medidas alternativas à prisão provisória
estão: o comparecimento em juízo, a proibição de acesso a determinados lugares,
a proibição de manter contato com uma
pessoa específica, a proibição de se ausentar da comarca, o recolhimento domiciliar, a suspensão do exercício da função
pública, a internação provisória nos casos
de imputabilidade, fiança e monitoração
eletrônica.
A pesquisa contou com duas partes: análise
quantitativa sobre os casos de prisão provisória flagrantes no ano de 2011 no Rio de
Janeiro e uma pesquisa qualitativa com entrevistas a defensores, juízes, promotores,
advogados e observação de audiências. Na
pesquisa quantitativa, foram analisados um
total de 6.084 réus envolvidos em 5.400
processos de janeiro a dezembro de 2011.
Foi obtida a lista da distribuição dos flagrantes do Judiciário. No final, foi possível
comparar - porque a informação não está
completa em todos os casos - a situação de
3.339 detidos antes da entrada em vigor da
lei com a de 2.745 detidos depois da entrada em vigor da lei. A pesquisa qualitativa
entrevistou 36 juízes, promotores, defensores e advogado e observou 10 audiências de
julgamento.
A primeira constatação é que, na primeira
medida tomada pelo juiz após a prisão em
flagrante, 79% dos réus foram mantidos
em prisão provisória e apenas 21% tiveram
acesso a outra medida cautelar diferente da
prisão provisória. Ou seja, a prisão provisória é a medida 6WFV