Relatório anual da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2014 | Page 53
to o inimigo de hoje for o “subversivo” de
ontem precisaremos enfrentar o alicerce
do modelo de representação política que
sustenta o capitalismo, não importando os
rótulos da democracia quando as desigualdades são alarmantes.
Se eu pudesse apostar em uma fórmula
para enfrentar essa desigualdade, começaria pela revisão da Lei da Anistia, pois a
lógica do perdão é o que permite a continuidade de práticas incapazes de promover
qualquer mudança.
O que aconteceu em nosso país no ano de
1979 quando a Lei da Anistia foi aprovada
é uma aberração. Ninguém pode discordar
da anistia dada aos que enfrentaram e conseguiram sobreviver a ditadura, mas como
concordar com anistia para torturadores,
estupradores, facínoras que não cometeram crimes políticos, ou alguém acha que
arrancar mamilos e estuprar mulheres ou
colocar baratas e jacarés para obter confissões é crime político?
É por essas e outras que acredito em um
movimento na sociedade brasileira capaz
de enfrentar essa barbaridade.
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Defendo as políticas adotadas desde
1995 que admitem a responsabilização
do Estado por essas violações de direitos
humanos. A lei nº 9.140/95 (com as alterações da lei nº 10.875/2004) que reconheceu como mortas e com direito à
reparação as pessoas ali nomeadas e a lei
nº 10.559/2002 que criou a Comissão de
Anistia são bons exemplos. Contudo são
exemplos políticos com desdobramentos
administrativos através de reparações pecuniárias e simbólicas e continuam afastando qualquer possibilidade de ações
judiciais. Não adianta reparar com a expectativa de promover uma reconciliação
nacional forçada. Se há de fato vontade
mudar, e aqui cabe um reconhecimento
a Presidenta Dilma que criou a Comissão
Nacional da Verdade, os resultados para
que possamos falar em ruptura só virão
no dia em que a justiça bater à porta dos
autores das violações, sejam esses agentes militares, empresários nacionais e internacionais, permitindo o direito ao contraditório e a ampla defesa, algo que eles
negaram àqueles que foram, e continuam
sendo, mortos e torturados. Ou isso, ou a
justiça de transição sem ruptura continuará sendo a justiça da transação.