RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA AS EXECUÇÕES SUMÁRIAS NO RJ | Page 17

Contrapontos de cidadania Um mês antes da posse de Brizola, uma incursão da Polícia Militar na Cidade de Deus resultou na morte de cinco pessoas. Os policiais registraram o caso como auto de resistência – quando, em confronto, as mortes se dão em legítima defesa. De acordo com a versão oficial, uma denúncia anônima revelou a existência de uma boca-de-fumo que funcionava em um dos apartamentos do conjunto. Quando chegaram ao local, foram recebidos a tiros e revidaram. Segundo o cabo Osmar Pereira, que participou da incursão: Eu nem sei quem eu matei. Naquele apartamento era matar ou morrer. Do nosso lado não tombou ninguém. Felizmente demos sorte. Estou com a consciência tranquila. Como policial, cumpri meu dever. [O Globo, 22/01/83]. Em uma rara atitude, seis moradores indignados se ofereceram para testemunhar sobre o ocorrido. A versão das seis testemunhas que presenciaram a ação do sargento Roberval Soares Silva, do cabo Osmar Pereira, e dos soldados Paulo Cesar Rodrigues Costa, José Lisboa Cabral e Milton Ferreira – todos do 18º BPM – no apartamento 307 do bloco 08 do conjunto Gabinal Margarida, foi, no entanto, diferente. Segundo noticiado no Jornal do Brasil em 29/01/83, as testemunhas contaram que os cinco rapazes vinham correndo da polícia, gritando para não serem mortos, enquanto o camburão da PM vinha em seu encalço, de portas abertas, de onde os policiais atiravam. Os cinco entraram no prédio e se refugiaram no apartamento 307. Testemunhas que assistiam da rua o desenrolar da perseguição contaram que os jovens atiraram pela janela as três armas que levavam com eles – e que foram recolhidas pelos policiais que, em seguida, subiram. Outras testemunhas acompanharam de suas janelas o que sucedia no interior do apartamento. Um dos jovens estava com os braços levantados, em sinal de rendição. E foram assassinados. Os laudos emitidos pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli desmentem a versão de troca de tiros. Só havia marcas de projéteis na parede onde os rapazes se encontravam. Ao todo, os cinco levaram 32 tiros. À época, o jurista Heleno Fragoso, um dos mais importantes nomes da área no direito penal no Brasil, comentou a operação: Não parece que a PM esteja executando sua tarefa dentro da lei. A função policial é a de submeter delinquentes à Justiça e não de fazer justiça