Português para estrangeiros Português para estrangeiros | Page 215

— Não digo para não me humilhar diante de meus filhos! Não dou o braço a torcer! Quero conservar a força moral que devo ter nesta casa! Vá para o diabo! E o Senhor Rodrigues, exasperadíssimo, nervoso, deixa a sala de jantar e vai para o seu quarto, batendo violentamente a porta. No quarto havia o que ele mais precisava naquela ocasião: algumas gotas de água de flor de laranja e um dicionário… A menina toma a palavra: — Coitado do papai! Zangou-se logo depois do jantar! Dizem que é tão perigoso! — Não fosse tolo — observa Dona Bernardina — e confessasse francamente que não sabia o que é plebiscito! — Pois sim — acode Manduca, muito pesaroso por ter sido o causador involuntário de toda aquela discussão — pois sim, mamãe; chame papai e façam as pazes. — Sim! sim! façam as pazes! — diz a menina em tom meigo e suplicante. — Que tolice! duas pessoas que se estimam tanto zangarem-se por causa do plebiscito! Dona Bernardina dá um beijo na filha, e vai bater à porta do quarto: — Seu Rodrigues, venha sentar-se; não vale a pena zangar-se por tão pouco. O negociante esperava a deixa. A porta abre-se imediatamente. Ele entra, atravessa a casa e vai sentar-se na cadeira de balanço. — É boa! — brada o Senhor Rodrigues depois de largo silêncio; — é muito boa! Eu! Eu ignorar a significação da palavra plebiscito! Eu!… A mulher e os filhos aproximam-se dele. O homem continua, num tom profundamente dogmático: — Plebiscito… E olha para todos os lados, a ver se há por ali mais alguém que possa aproveitar a lição. — Plebiscito é uma lei decretada pelo povo romano, estabelecido em comícios. — Ah! — suspiram todos, aliviados. — Uma lei romana, percebem? E querem introduzi-la no Brasil! É mais um estrangeirismo!… (In —— Contos fora da moda. p.57-61). Português para estrangeiros | Ester Ester Abreu V. de Oliveira 215