PoliticArs Único | Page 27

erick porral

Vasos comunicantes: poesia e filme, política e arte

Para adentrar na consciência delirante do protagonista-poeta e poder tecer a respeito da obra do diretor brasileiro, tomarei de empréstimo palavras de Shakespeare, em Romeu e Julieta – relacionando com a concepção de Danon-Boileau quanto à preservação na memória do “efeito violento” da mensagem estética-poética: “Esses prazeres violentos têm fins violentos/ E morrem em seu triunfo, como o fogo e a pólvora, que, ao se beijarem, se consomem.” De acordo com a formulação do autor e com a ressignificação atribuída por Kristeva, em seu livro Meu Alfabeto, essa capacidade de deslocamento do estrato do signo linguístico por meio das metáforas-metamorfoses em um impacto sensorial - move, impele o leitor/espectador (discutirei mais adiante essa ambivalência na obra de Rocha) para a sensação, o prazer experimentado – um direcionamento rumo a uma sinestesia perigosa, conflitante e, acima de tudo, caótica.

Assim como Baudelaire, Rocha é afeiçoado ao poder, de um certo modo, bárbaro, da oscilação do signo na sensação. Terra em Transe está para Flores do Mal, como a água para o gelo, elementos em estados e tempos distintos, porém com fortes mensagens semelhantes: que não agradam, que não escolhem lados, que esfacelam a lógica maniqueísta, que não procuram o essencial. Sou arte em mim, diria a obra, se pudesse falar. Eu represento, eu questiono, eu escancaro, eu provoco, eu me submeto também, por quê, não? Eu sou arte. Poderia eu não ser? Não há pulsões conciliatórias, a síntese, da tese e antítese, é ultrapassada, amalgama-se tudo: signos linguísticos,

25