Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume Especial COVID-19 | Page 49

Nos questionamos se, na prática, uma criança conseguiria ocupar tal posição de destaque, poder e resolução. Algo nos diz, que diante do cenário atual, por mais absurdo que fosse, parece que a sabedoria infantil teria talvez, mais assertividade que parte do poder político vigente. Dessa forma, a magia e a ficção infantil ganham corpo e esperança principalmente a partir do catastrófico cenário político. Em meio a pandemia no cenário brasileiro, com mais de 100 mil mortes por COVID-19 e cerca de 4 milhões de infectados, parece que só a magia oferta conforto perante a realidade:

Por sorte, as crianças são muito mais espertas, elas são adeptas irrestritas da ficção e quanto mais mágica, onírica, radical e absurda, melhor. Pode-se também traçar um paralelo interessante com a poesia, através da qual as palavras se tornam ferramentas polivalentes. Crianças adoram trocadilhos, rimas divertidas, sentidos surpreendentes e humor, e é nisso que a julgamos sábias, pois o domínio da língua flexibiliza o entendimento da realidade e faz nosso pensamento mais versátil e ágil. Enfim, é uma sorte que na mesma época em que estamos em formação arrumando as malas que conterão os fundamentos que vamos levar na viagem pela vida afora, sejamos consumidores vorazes de ficção. (CORSO e CORSO, 2006, p.303 e 304)

Um dado interessante é que para essas crianças parte da solução está no movimento de evacuação do país, encaminhando a população para lugares extremos do mundo, como por exemplo a “Antártida” (sic). Tal movimento de evacuação é reconhecido historicamente em situações guerra, a saber a obra de Winnicott (1999a), que tão didaticamente relata o período de evacuação das crianças na cidade de Londres em função do ataque nazista na segunda guerra mundial. Tal situação pode nos ofertar a hipótese de que parte das crianças pesquisadas, podem também estar vivendo, em menores graus, sensações similares as crianças que viviam isoladas e reclusas em casa durante o período de guerra em função do perigo dos bombardeios, ou que sofriam deprivações mediante o afastamento brusco de seu cotidiano familiar e social. Winnicott aponta como deprivação a seguinte situação:

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PATHOS / V.. Especial , Set. 2020 48