Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume 07 | Page 53

Nesta prescrição social, fixa-se uma norma, restringe-se a pluralidade de manifestações da sexualidade e do desejo e classifica como “desvios” os encadeamentos que fogem a estes dois arranjos (Butler, 2017; 2004).

Na lógica heteronormativa, homens se relacionam instintiva e naturalmente com mulheres enquanto gêneros opostos que se atraem mutuamente. Entretanto, essa lógica pressupõe, antes, a cisgeneridade, uma vez que a classificação homem/mulher está socialmente condicionada à anatomia do corpo. Esta é a cisnorma, que caracteriza como padrão de referência da normalidade a cisgeneridade.

O termo cisheteronormatividade caracteriza, então, um conjunto de normas que pressupõe pessoas sempre cisgêneras e heterossexuais enquanto desfecho natural da constituição da subjetividade humana (Rosa, 2020). Como um sistema de crenças sociocultural, a cisheteronormatividade coloca o sujeito não-cisgênero e/ou não-heterossexual em uma posição de ininteligibilidade ao tomar por desviantes os processos identificatórios que rompem com o padrão. Este mecanismo denuncia que, culturalmente, a expectativa social sobre o encadeamento “normal” dos elementos sexo-gênero-desejo (ainda) é que corpos com vagina sejam identificados enquanto mulheres e se atraiam sexualmente por homens e estes últimos sejam identificados desta forma ao apresentar um corpo com pênis e o desejo sexual orientado para mulheres.

Uma sociedade cisheteronormativa é aquela na qual a cisgeneridade é a norma e os padrões de comportamentos heterossexuais são dominantes e todos aqueles contrários a esse padrão são estigmatizados e punidos. Simplificando, apesar dos avanços em relação ao debate de gênero e sexualidade, que visa ampliar as perspectivas sociais a respeito da pluralidade de identidades e orientações sexuais do ser humano, ainda vivemos em uma sociedade intensamente gendrificada e moldada em uma estrutura cisheteronormativa, na qual está vigente uma ordem de gênero que predetermina os percursos sociais alocados sobre as pessoas à serviço do controle dos corpos e subjetividades do ser humano.

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