Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume 07 | Page 70

É preciso observar a necessidade de priorizar as vozes dos atores da experiência, fazendo-se valer as vantagens da pesquisa empírica com pessoas trans e familiares, ao invés de produzir saberes embasados majoritariamente na experiência clínica de profissionais de saúde, em sua maioria, cisgêneros.

De acordo com Djamila Ribeiro (2017), lugar de fala é o lugar de onde observamos e experienciamos o mundo. Assim, demarcar o lugar de onde falamos não diz respeito à hierarquização de opressões, mas ao reconhecimento das diferenças estruturais que entrelaçam nossas experiências sociais, fruto de normas de ajustamento. Isso quer dizer que nossas vivências são inevitavelmente atravessadas por marcadores como gênero, raça/etnia, classe social, orientação sexual e posições de privilégio. Uma mulher cisgênero (cis), branca, heterossexual e acadêmica experimenta vivências sociais diferentes de uma mulher cis, negra, homossexual e periférica.

Constatar que, em pleno século XXI, pessoas ainda precisam lutar para existir como são, reivindicar o acesso a direitos básicos e resistir a violências e discriminações que se fundamentam no desconhecimento e preconceito, é, no mínimo, um sinal de que algo não vai bem na dinâmica que criamos para viver enquanto sociedade. Pensar diversidades de gênero é se deparar com a beleza da capacidade humana da autoexpressão, da agência e da resiliência. É também se deparar com a complexidade e pluralidade da constituição da subjetividade das pessoas. Paradoxalmente, apesar de complexo, o tema é muito simples. Basta reconhecer que as possibilidades de identidades de gênero são diversas e igualmente legítimas possibilidades de ser.

Sobre possíveis interlocuções das perdas e do luto e as diversidades de gênero, há de se pontuar a poderosa capacidade de resistência de pessoas que vivenciam diariamente violências por parte de uma dinâmica social que as reconhece como vidas que merecem ser enlutadas e brutalmente as enlutam.

Σ

PATHOS / V. 07, n.01, 2021 69