Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 3º Volume | Page 15

Aspecto que Abraham e Torok, também corroboram situando a doença do luto no âmbito das neuroses intergeracionais (MORENO, 2009).

O objeto amado e sua própria boca cheia de palavras que tiveram de ser sepultadas define um encontro onde não há um garantia necessária da significação das palavras, ou seja, não há palavras capazes de sustentar uma “boca vazia”. Um encontro de gerações, metaforizado pelo casal como o encontro de “bocas”, que desde o início podem dar o destino da introjeção quanto ser seu obstáculo. A introjeção se dá pelo encontro de “bocas vazias”, graças a :

experiência do vazio da boca, duplicada por uma presença materna. Esse vazio é inicialmente vivenciado como gritos e choros, preenchimento adiado, depois como ocasião de apelo, meio de fazer surgir a linguagem. Depois ainda, como autopreenchimento fonatório, pela exploração linguo-palto-glossal do vazio, em eco a sonoridade percebidas desde o exterior e, finalmente, como substituição progressiva parcial das satisfações da boca, cheia do objeto materno, pelas boca vazia do mesmo objeto, mais cheia de palavras endereçadas ao sujeito. A passagem da boca cheia de seio à boca cheia de palavras se efetua por meio de experiência de boca vazia. (Abraham e Torok, 1995:. 246)

A história de Edna, diz do impossível da “experiência de boca vazia”, ela traz para a análise: uma boca cheia de seio, uma boca cheia de palavras denegadoras da realidade, uma possível edificação da realidade do segredo. Segredo que Edna anuncia na sessão anterior na qual faz o desenho, objeto de nossa análise. A paciente diz ter um segredo e “ameaça”: “Se eu te contar o meu segredo eu vou ter que te engolir”.

O referencial até aqui privilegiado nos permite corroborar a hipótese de uma figuração da incorporação no desenho de Edna. Sua história que desde o início assinala a precariedade da função materna no sentido de viabilizar o “encontro de bocas vazias”, sendo marcada por um vinculo libidinal que só pode ser considerado à luz de um mais além. Com a psicanálise sabemos que é o vínculo libidinal que irá constituir os seres e não o contrário, portanto, a função libidinizadora da maternagem é constituinte do sujeito psíquico, do corpo erógeno.

Dentre as três funções de pára-excitação apontada por Fernandes (2006) – proteção, mediação e libidinização – a função libidinizadora “reprenta uma condição de possibilidade para a fusão das pulsões. (p. 206). A função de para-excitação materna só será “parcialmente” substituída pela sua introjeção. A impossibilidade de introjetar, nesta linha de raciocínio, levaria a pensar na possibilidade da desfusão pulsional para os que, no lugar da introjeção, encontram o caminho da incorporação.

PATHOS / V. 03, n.02, 2016 14

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