Durante alguns minutos , o subdiretor metralhou o texto , corrigindo , quando não amputando , e resmungando como se eu não estivesse ali . Sem saber o que fazer , vi que havia uma cadeira encostada na parede e fiz menção de sentar .
— Quem disse que podia se sentar ? — murmurou dom Basilio , sem levantar os olhos do texto .
Levantei apressadamente e contive a respiração . O subdiretor suspirou , deixou cair o lápis vermelho e reclinou-se em sua poltrona para examinar-me como se eu fosse um traste imprestável . — Me disseram que você escreve , Martín . Engoli em seco e quando abri a boca , só o que saiu foi um ridículo fio de voz . — Bem , um pouco , quer dizer , não sei ... Ou seja , sim , escrevo ... — Espero que escreva melhor do que fala . Mas escreve o quê , se não for demais perguntar ? — Histórias policiais . Quero dizer ... — Já peguei a ideia . O olhar com que dom Basílio me brindou é indescritível . Se eu tivesse dito que me dedicava a fazer figurinhas de presépio com esterco fresco teria obtido o triplo de entusiasmo . Suspirou de novo e deu de ombros .
— Vidal diz que o senhor não é de todo mau . Que se destaca do resto . Claro que , com a competência que se vê por essas bandas , também não é preciso ser grande coisa . Mas se Vidal falou .
Pedro Vidal era a estrela literária de La Voz de la Industria . Escrevia uma crônica semanal na editoria de polícia , que constituía a única coisa que merecia ser lida em todo o jornal , e era autor de uma dezena de livros de suspense sobre gângsteres do bairro do Raval vivendo em promiscuidade com damas da alta sociedade , os quais lhe garantiram uma modesta notoriedade . Metido invariavelmente em impecáveis ternos de seda e reluzentes mocassins italianos , Vidal tinha os traços e os gestos de um galã de sessão da tarde : cabelo louro sempre bem penteado , bigode espetado e o sorriso fácil e generoso de quem se sente bem na própria pele e no mundo . Provinha de uma dinastia de imigrantes que tinha feito fortuna nas Américas com negócios de açúcar e que , na volta à Espanha , tinha cravado os dentes numa suculenta fatia do plano de eletrificação da cidade . Seu pai , o patriarca do clã , era um dos acionistas majoritários do jornal , e dom Pedro usava a redação como pátio de recreio para matar o tédio de nunca , nem um único dia de sua vida , ter trabalhado por necessidade . Pouco importava que o diário perdesse tanto dinheiro