Matão (SP), 11 de Outubro de 2013 — Ano 23 — nº 286
Cultura popular independente e evolucionária!
"Sê gracioso para conosco,
ó Eterno, sê gracioso para
conosco, pois já estamos
completamente fartos
de desdém. Nossa alma
transbordou com o
menosprezo dos tranquilos
e com o deboche dos
arrogantes." / Salmo CXXIII
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Este será
um país livre
quando
nenhuma
criança passar
fome ou estiver
sem escola!
jornal o boêmio
IGNORÂNCIA CONSUMADA
Tentando tapar o sol com a peneira, orgulhosos da própria
ignorância, seguem os homenzinhos entediados a caminho do
trabalho. Ali, sob o manto da produtividade e da autoridade contumaz,
podendo subjugar "seres inferiores", eles se realizam vivendo uma
realidade ilusória que satisfaz por instantes a sanha inconsequente
de buscar prosperidade (detonando o planeta) e acumular dinheiro
(humilhando pessoas). Pouco depois, a solidão se faz notar. Com
tanto dinheiro no bolso e ainda assim morrendo pouco a pouco,
vitimados por doenças que acometem um espírito desolado repleto
de maldade. Mentes quem mentem, enganam, trapaceiam, não
possuem amigos a não ser a própria esfacelada face refletida no
espelho. Querem enriquecer sozinhos, mas para o fundo do poço
levam quantos puderem. Submergindo no lodaçal imundo que lhes
rouba identidade, ideal, honestidade e respeito, são monótonos e
iguais. Homúnculos de negociatas! Meramente confusos, violentos
e depressivos, passando por cima de tudo e de todos para chegar
lá. Aonde eu vou, não sei, mas sigo pensando que é melhor viver
gritando do que calado definhar sem motivos para resistir. A
escuridão não é apenas ausência da luz, mas um modo de se
posicionar frente aos acontecimentos, onde somos protagonistas
ou espectadores. O sistema é bruto, sim, mas meu coração acolhe
a quem se aproxime com flores nas mãos, sementes de hortaliças e
cereais, propósitos comunitários. Apreciamos a natureza, seguimos
o rio em sua correnteza, ecoamos a algazarra da floresta, mesmo
que seja a floresta urbana, onde o caos e a mansidão se juntam na
praça em frente à matriz. O pássaro que tem seu ninho na árvore
centenária e histórica convive com o mendigo simpático que dorme
nos bancos ao redor da fonte e é expulso dali todas as manhãs,
pela gritaria das crianças. Nos dias de semana, o centro da cidade
lembra um alegre e colorido formigueiro humano, cada formiga
sentindo-se única, cruzando apressada, algumas em grupos,
tagarelando sobre o clima, futebol, compras, dívidas, dúvidas...
Aglomerados lendo as manchetes nos jornais da banca de revistas.
Formigas fêmeas carregando imensas bolsas com quinquilharias e
formigas homens com chapéu, cartão de crédito e horários a cumprir.
"Somos todos penitentes e reféns do relógio", diz um chapeleiro
maluco enquanto corre a pagar uma conta. "O tempo somos nós
quem fazemos pois possuímos o livre arbítrio", retruca o formigão
escolado, desviando-se de um cocô de cachorro. E a correria da
metrópole vai engolindo um a um, do beato de olhar escarnecido
ao meliante vestindo terno e gravata. Da menina vaidosa que se
julga a mais bela da vila à velha senhora que sabe que tudo é ilusão.
É preciso esvaziar os sentidos e abrir os olhos para enxergar
plenamente. Relativizar opiniões, acalmar sentimentos, energia e
pensamentos. Homúnculo de negociatas, escravo do capital —
cinza, árido e frio: coloque o pé na terra. Tenha medo, assuste-se,
irrite-se com a impotência em modificar o destino, quando mais é
preciso. Não é tudo que podemos comprar, você percebeu?