31 de Janeiro de 2018 Barroso
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31 de Janeiro de 2018 Barroso
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Política municipal vista de fora
XXVII Feira do Fumeiro: objetivos não cumpridos
Como é sabido, e eu já escrevi sobre isso, a Associação dos Produtores de Fumeiro da Terra Fria Barrosã concorreu aos fundos comunitários PORTUGAL 2020 para“ revitalizar a fileira do fumeiro” e o seu projeto foi financiado em 500 mil euros. Passado pouco tempo, a mesma Associação achou que meio milhão era pouco, que não podia realizar o seu trabalho com tão pouco dinheiro e pediu mais 80 mil ao orçamento municipal, dos quais 35 mil imediatamente. Alegou
má qualidade do fumeiro e perigos eminentes que estavam a ameaçar este tipo de certame e era preciso corrigir. A Câmara reconheceu que era verdade e deu-lhe mais os 80 mil. A Associação foi financiada pois em 580 mil euros. A isso somam-se as normais despesas na organização da Feira / Festa a cargo do orçamento municipal; acresce ainda o subsídio ao abate dos animais no matadouro do Barracão para elevar a qualidade do fumeiro. No fim de contas, a Associação deverá ter sido financiada com mais de um milhão de euros.
Com todo esse dinheiro a Associação pretendia combater as várias ameaças que pairavam sobre a Feira e aplicar medidas de correcção, como sejam: a publicação de um Manual de Boas Práticas de Fabrico e visitas de estudo( que fez várias), passando por um trabalho de campo junto dos produtores, com visitas às suas cozinhas, até inspecionar com rigor o fumeiro que entra na feira.
Pretendia ainda a Associação implementar“ novos métodos e novas práticas de fabrico”, a“ organização da produção”, a“ promoção da competitividade do setor, estimulando a competição dos agentes económicos da fileira e a adoção de boas práticas e novos métodos nos processos de fabrico do fumeiro”, o“ rejuvenescimento da fileira e atração de jovens e o aparecimento de novos produtos inovadores”, a“ promoção dos produtos a nível nacional”, a“ criação de uma plataforma on-line”, o“ negócio do leitão e a produção de animais para venda”.
Terminada a XXVII Feira do Fumeiro, é altura de fazer o balanço e ver se aqueles objetivos foram cumpridos.
Amigo leitor, posso dizer a correr que não foram e que o acréscimo exponencial de dinheiro não significa mais e melhor Feira / Festa. A Feira foi, em tudo, mais ou menos como a de 2017.
Não vi a publicação de nenhum Manual de Boas Práticas de Fabrico, e alguém viu?
Não vi implementar“ novos métodos e novas práticas e
“ O acréscimo exponencial de dinheiro não significa mais qualidade, mais vendas e melhor Feira / Festa. Atendendo aos propósitos a que a Associação do Fumeiro se propunha e aos resultados alcançados, podemos dizer que os objetivos não foram alcançados. Há problemas graves que afetam a criação de porcos e de bezerros, mas acerca dos quais ninguém fala. Montalegre está a perder terreno, mas continua a‘ assobiar para o lado’”.
novos métodos nos processos de fabrico do fumeiro”, nem sei como isso possa ser possível ou precise de o ser. Então o processo de fabrico tradicional não serve?
Não vi o rejuvenescimento da fileira e atração de jovens. Onde estão os muitos doutores, sobretudo advogados, que a Câmara propagou à comunicação social que faziam fumeiro e viviam disso? É certo que há alguns jovens, mas é a vender na barraca, por questões de“ marketing” de venda, mas não são eles que criam os recos e porcos e que carregam ao lombo a lavadura para a pocilga.
Não vi a expansão e massificação do número de produtores. Das 80 barraquinhas, menos de 70 eram dedicadas à venda de fumeiro e pouco mais de 10 a outros produtos: pão, licores, mel, batata, derivados de pão … Isso dá uma média de apenas meio produtor por aldeia! Onde está a massificação da Feira e do número dos produtores?
Não vi o aparecimento de novos produtos inovadores, mas os tradicionais e que sempre se venderam na feira, carne fumada, presunto, chouriças e alheiras …
Não vi a criação de uma plataforma on-line.
Não vi o negócio do leitão. Aliás, a grande maioria dos produtores não faz criação em casa, mas compra os porcos já adultos, alimentando-os em sua casa nos meses seguintes. E fico-me por aqui, porque o que tenho ouvido acerca disto não é nada agradável de se dizer...
Não vi a produção de animais para venda e, quando isso é feito, trata-se de um número muito escasso de porcos, já que não existe negócio consolidado.
Não vi os porcos serem todos levados ao matadouro como disse o Presidente à comunicação social:“ para garantir essa qualidade, o presidente frisou que todos os
animais são obrigatoriamente abatidos no matadouro local”, mas apenas ser levada uma pequena parte. Aliás, na minha aldeia, o que foi difundido foi o seguinte:“ é conveniente que alguns sejam abatidos no matadouro; quanto aos restantes pode fazer-se a tradicional matança.”
Não vi as pessoas alimentarem os porcos com os produtos da terra, mas a servirem-se da batata de Xinzo. A batata, o cereal e a ração de Xinzo de Limia são hoje os grandes cevadores dos porcos e bezerros das aldeias, especialmente as da linha da fronteira. Um produtor disse-me:“ Não me compensa semear batatas e cereal. Se os quero para porcos e bezerros vou a Xinzo e a maior parte das pessoas faz igual”.
Pelo contrário, vi a grande e tradicional comezaina que antecede a Feira / Festa do Fumeiro e acerca da qual a Câmara nada disse, nem publicou nenhuma foto. Eram pouco menos de mil pessoas, a grande maioria das quais nada tinha a ver com a feira.
Vi que muito fumeiro continua a ser vendido um pouco verde, para pesar mais. Uma pessoa experiente disseme:“ Julgas que o fumeiro que vai para a feira é tão seco como o que se come em casa?”
Por isso vi que as pessoas comprarem fumeiro em pequena quantidade.
Por isso vi produtores desanimados por venderem pouco, ao passo que a propaganda que a Câmara faz é de que a meio da Feira já não há nada para vender. Isso cria primeiro grandes expectativas e mais tarde grandes desilusões. Ainda assim, esta feira pareceume melhor do que as duas anteriores.
“ Não é tanto pela economia da região que se faz a Feira, até porque só teve 70 produtores, o que dá uma média de um vendedor de fumeiro por duas aldeias. É antes pelo espetáculo que ela proporciona aos agentes políticos locais, a vaidade, a promoção individual e os tais 5 minutos de fama.”
Por isso vi produtores a dizerem, desiludidos, que não voltam lá. E é verdade, pois a feira teve menos de 70 barracas, o que significa que o número de produtores está a diminuir. Se diminui por alguma razão é.
Vi também que há produtores que, para venderem mais, criam os porcos e vivem numa aldeia e assinalam na barraca o nome de outra aldeia por julgarem que dessa forma vão vender mais.
Amigo leitor, acerca da XXVII Feira do Fumeiro importa dizer que o acréscimo exponencial de dinheiro colocado ao serviço da Associação não significa melhor feira, mais vendas ou mais produtores. Os objetivos a que se propôs a Associação não foram cumpridos. Exige-se também menos comezainas, menos propaganda e mais transparência para não iludir os produtores e os consumidores. O grande problema, que não vejo a ninguém discutir, é a dificuldade que as pessoas têm em alimentar os animais, dada a esterilidade da região e a pequenez da propriedade. Por isso recorrem a produtos galegos e, neste momento, grande parte do dinheiro gerado com o fumeiro ou a criação de bezerros regressa à Galiza para financiar a importação da ceva dos animais. Neste momento, os galegos também já nos vendem fumeiro verde, tendo os portugueses apenas o trabalho de o pôr ao fumo. Vendo o que se passa de um e de outro lado da fronteira, Montalegre está claramente a perder terreno; perde terreno, mas continua a“ assobiar para o lado” e alimentar a ilusão de que tudo está bem.
MANUEL RAMOS