My first Magazine Revista Sarau Subúrbio ed 02 | Page 21
Contudo, outros aspectos de sua produção não foram bem explicitados, pelo
menos como everiam, por exemplo, o cronista. Geralmente quando se fala em
cronistas da MPB são citados Noel Rosa e Chico Buarque, com muita propriedade,
por sinal, e ainda um Wilson Batista (com certa incipiência também), porém, o
compositor não é lembrado neste quesito, o qual tem uma relevante contribuição,
porém, pouco estudada e reconhecida. Se cotejarmos sua obra com a de outros
compositores da época, por exemplo, os emblemáticos Cartola e Nélson Cavaquinho
podemos perceber que os temas desenvolvidos por estes dois mangueirenses
tinham como mote, quase sempre, valores e sentimentos universais que espelham
a dicotomia subjetivismo/universalismo.
Em Nelson Cavaquinho temos a ‘solidão’ em “Luz Negra”, a ‘traição’ em
“Notícia”, a eterna luta do ‘bem contra o mal’ em “Juízo Final”, a ‘tristeza’ em
“Visita Triste” e a ‘saudade’ em “Quando eu me chamar saudade”. Em Cartola
reconhecemos o desenvolvimento dos temas universais como a ‘culpa’ em “Não”,
os ‘sonhos’ em “O mundo é um moinho”, a ‘fé’ em “Deus te ouça” e o ‘verdadeiro
amor’ em “Divina Dama”, uns poucos exemplos destes dois ícones da nossa cultura
musical.
Em Geraldo Pereira a veia de cronista urbano se faz mais latente. Vejamos
então algumas de suas músicas que abordam e desenvolvem certas facetas nesta
seara:
1 - o popular jogo do bicho em “Acertei no milhar” (c/ Wilson Batista, 1940);
2 - o ambiente das gafieiras, a maioria já desaparecida, do centro da cidade em
“Sem Compromisso” (c/ Nelson Trigueiro, 1944) e “Chegou a bonitona” (c/ José
Batista, 1948);
3 - a expressão das religiões de matrizes africana em “Pisei num despacho” (c/
Elpídio Viana, 1947);
4 - um meta-samba (samba que fala do próprio gênero) em “Que samba bom” (c/
Arnaldo Passos, 1949);
5 – sua incursão na política em “Ministério da Economia” (c/ Arnaldo Passos, 1951),
na qual são retratados fatos e dados ligados à criação do referido órgão pelo
presidente Getúlio Vargas;
6 – a violência da polícia nas favelas em "Polícia no morro" (c/ Arnaldo Passos,
1952);
7 - a gastronomia do universo do samba em “Cabritada mal sucedida” (c/ Jorge
Gebara, 1953);
8 - a geografia urbana carioca e suas favelas, algumas já desaparecidas, em
“Escurinho” (1954).