26 :: H ISTÓRIA :: M ÓDULO 1
O desenvolvimento do comércio teve duas consequências importantes para
a sociedade feudal. A primeira delas foi o crescimento dos centros urbanos, onde
se realizavam não só as trocas comerciais como também as ativida des bancárias
– empréstimo de dinheiro e câmbio de moedas diferentes, por exemplo. Era nas
cidades que moravam os comerciantes e banqueiros enriquecidos e surgiam ou se
multiplicavam as universidades e escolas.
Assim, a vida urbana ganhou importância e abriu novas perspectivas para as
pessoas. No caso de um camponês, por exemplo, morar na cidade podia significar
a conquista de um emprego numa oficina de artesanato, numa loja ou na casa
de um comerciante, levando-o a fugir da exploração do senhor feudal e melhorar
suas condições de vida. Por isso, as cidades atraíram um grande número de servos.
Observe no mapa como cidades e rotas comerciais se cruzavam na Europa.
A segunda consequência importante do crescimento do comércio foi o
surgimento de um novo grupo social, formado pelos comerciantes enriquecidos
e que chamamos de burguesia. Moradores das cidades, os burgueses construíram
suas fortunas através do grande comércio e das atividades bancárias, baseados na
ideia de lucro e na posse de uma riqueza que não consistia em propriedades rurais.
Ou seja, estamos falando de um grupo social em ascensão cujo estilo de vida era
muito diferente daquele que caracterizava o nobre feudal – senhor da guerra e
proprietário rural.
Isto, porém, não nos permite afirmar que nobres e burgueses eram inimigos e
não estabeleciam relações entre si. Muito pelo contrário. Apesar de serem muitas
vezes mais ricos, os burgueses invejavam o prestígio social dos nobres. Por sua vez,
a fortuna burguesa era objeto de cobiça dos aristocratas. Assim, estabeleceram-se
entre esses dois grupos sociais relações sociais e econômicas, como o casamento
entre filhos de nobres e burgueses, que reuniam numa família só a riqueza e o
prestígio. Na nova sociedade que ia surgindo, os dois caminhariam juntos.
:: Síntese ::
A sociedade europeia a partir do século XI se caracteriza pelo:
s AUMENTO DA POPULA ÎO EUROPEIA RESULTANTE DO lM DAS GUERRAS
CONTRA POVOS ESTRANGEIROS E DO AUMENTO DA PRODUTIVIDADE AGRÓCOLA
s DESENVOLVIMENTO DO COMÏRCIO DE PRODUTOS EUROPEUS E ORIENTAIS
ESTABELECENDO CIRCUITOS COMERCIAIS IMPORTANTES
s CRESCIMENTO DOS CENTROS URBANOS QUE PASSARAM A CONCENTRAR
IMPORTANTES ATIVIDADES ECONÙMICAS E ATRAIR A POPULA ÎO RURAL
s SURGIMENTO DE UM NOVO GRUPO SOCIAL A BURGUESIA COM UM NOVO
ESTILO DE VIDA
O século XIV e a crise da
sociedade feudal
Em fins do século XIII, já era possível perceber alguns sinais de que uma
época de crise se aproximava da Europa. O aumento do número de mendigos e de
epidemias e a falta de alimentos indicavam que a situação dos camponeses tinha
piorado. Vamos entender como isso aconteceu.
Como vimos no item anterior, a partir do século XI registrou-se o crescimento
da população na Europa. Com isso, houve a necessidade de cultivar mais terras para
acomodar as novas famílias camponesas. Muitas delas, entretanto, ocuparam terras
que não forneciam colheitas suficientes para pagar ao senhor feudal e garantir
sua alimentação. Outros camponeses nem terras conseguiram e vagavam como
mendigos pelas estradas. Por outro lado, os nobres aumentavam os impostos
cobrados dos camponeses, tomando para si uma parte maior de suas colheitas.
As cidades também foram atingidas por esse processo de empobrecimento.
Muitos camponeses migraram para os centros urbanos em busca de um emprego.
Com isso, o número de desempregados aumentou, fazendo os salários caírem.
Com menores salários, os habitantes das cidades tinham menos dinheiro para
consumir alimentos e outras mercadorias. Resultado: também os artesãos e
pequenos comerciantes urbanos viram suas rendas diminuírem.
Diante desse cenário de empobrecimento, três más colheitas no início do
século XIV acabaram detonando uma grande crise na sociedade. Com a pouca
oferta de alimentos no mercado, os preços subiram rapidamente e a fome se
espalhou pelos campos e cidades da Europa. Para se ter uma ideia, o preço do trigo
subiu 500% na Inglaterra e 2400% na região de Flandres (atual Bélgica). Sem
dinheiro nem para comprar pão, imagine o que aconteceu com as mercadorias
menos necessárias – como roupas, móveis e outros alimentos. Nas cidades,
artesãos e pequenos comerciantes foram à falência.
Enfraquecida pela fome, a população europeia não pôde resistir à epidemia
de peste bubônica que chegou ao continente em 1348, trazida pelos tripulantes
dos navios que faziam o comércio com o Oriente. Os índices de mortalidade foram
altíssimos! Um terço dos europeus morreu em consequência da doença. Vejamos
só um exemplo: a população da França, que era de 21 milhões no ano de 1340,
caiu para 14 milhões mais de um século depois, em 1470.
Não bastassem esses problemas, durante grande parte do século XIV, os
reis da Inglaterra e da França enfrentaram-se no conflito que ficou conhecido
como Guerra dos Cem Anos (1337-1453). Essa e outras guerras ocorridas no
mesmo período também colaboraram para a morte de muitas pessoas e para a
desorganização da produção agrícola.
Se para a maioria da população esse foi um tempo marcado pela fome, miséria
e morte, para os comerciantes que possuíam estoques de alimentos foi a época de
negociar os preços e conseguir grandes lucros. Os nobres mais poderosos também
tentaram se proteger da crise, aumentando os impostos cobrados dos camponeses.
Porém, o efeito dessa iniciativa foi uma série de revoltas, desestabilizando ainda
mais a sociedade feudal.
A crise do século XIV, como ficou conhecido o período marcado pela fome,
guerra e peste, provocou efeitos muito profundos na organização da sociedade
feudal. Para controlar essas revoltas e manter suas rendas, muitos nobres optaram
por modificar as relações sociais. Passaram a alugar parte de suas terras, em
troca de uma quantia fixa. Alguns deles, endividados, também foram obrigados
a vender suas propriedades a agricultores enriquecidos e burgueses. Por último,
muitos servos foram libertados, transformando-se em agricultores, que arrendavam
terras e buscavam produzir para o mercado.
Dessa forma, a ligação dos nobres com a posse da terra se modificou e a
manutenção de seu prestígio social deixou de ser baseada somente nos impostos
pagos pelos camponeses. A servidão, embora existente ainda por muito tempo em