Levante: A vida pós-cárcere de mulheres no Paraná Levante_Livro | Page 54
filha quando vai à penitenciária.
— Faço mais por instinto do que por merecimento dela —
conta, irritada.
Dos cinco irmãos, ela hoje vive com certa distância. O distanciamento
ocorreu quando ela parou para pensar que a dedicação
à eles dispensada não fluía nos dois sentidos.
— Pelos meus irmãos eu já tirei comida do meu próprio prato,
eu doaria meus dois rins e ficaria sem nenhum. Mas hoje, pensaria
duas vezes.
À primeira vista, tudo na vida de Renata caminha bem. Não é
mentira, está bem encaminhada e amparada. Mas se de uma coisa ela
tem certeza, é que a vida não está do jeito que ela quer. Ainda está,
em suas palavras, só empurrando com a barriga.
Seu primeiro plano para o futuro é meter o pé na bunda de
Jean. Reconhece a importância de todo o apoio emocional e mesmo
financeiro que ele lhe deu desde o início do relacionamento. Deixa
claro que ele não é um “homem ruim”. O problema é que, depois de
três anos juntos, a mania de controle e ciúme excessivo do marido
esgotaram sua paciência. Um dia, depois que ela saiu do trabalho,
esperamos o ônibus juntas. No tempo do curto percurso até a estação-tubo,
o celular ficou no bolso de seu casaco. Depois que passamos
a catraca, tirou-o para ver as horas: a tela mostrava mais de 15
chamadas de Jean. Ela retornou a ligação para saber o que é que ele
tanto queria. Era só para saber onde ela estava.
A frustração diante do cárcere matrimonial dá vazão a outros
sentimentos negativos. Ela tem surtos de raiva, não suporta mais as
observações e intromissões do outro em seu celular, sua vida, seus
assuntos. As discussões são acaloradas e, às vezes, ela não consegue
conter o ódio, que extravasa na forma de tapas, socos e mesmo uma
54 | LEVANTE