Levante: A vida pós-cárcere de mulheres no Paraná Levante_Livro | Page 27

Renata tem olhos escuros, risada fácil e perfume doce. É companhia perfeita para interlocutores introvertidos: as palavras que saem de sua boca cobrem rapidamente uma vasta gama de assuntos. Conversar com ela é não ver o tempo passar. No primeiro dia em que a encontrei, passamos a tarde caminhando no Centro de Curitiba. Em frente a uma banca que vende plantas na Rua XV de Novembro, descobrimos nosso gosto em comum por criar suculentas em vasinhos. Comentei que também tinha alguns cactus, ao que ela arregalou bem os olhos: — Não pode ter cactus dentro de casa! O motivo é que os espinhos são grandes sugadores de boas energias. Se você fizer questão de mantê-los, a solução, explicou, é deixar os vasos do lado de fora da casa. Desde então, vivo um dilema em relação a seguir ou não seu conselho supersticioso. Me preocupo com as boas energias. Quando pequena, Renata tinha um sonho: queria jantar em família, como nos filmes e comerciais de televisão. O pedido passou a ser feito diretamente para Deus assim que o padrinho, católico fervoroso, a ensinou a orar. Não demorou muito para que se frustrasse; o jantar em família não acontecia. Em suas próprias palavras, para desespero do padrinho, para essa causa era necessário alguém maior que o tal Deus. Um quarto de seus 29 anos de vida, que ela já arredonda para 30, foram passados em uma prisão. Ela não concorda com a estimativa: — Passei a minha vida inteira presa. Seus pais, dependentes químicos, dividiam o tempo entre as brigas violentas e o consumo de crack. Ela cuidava dos cinco irmãos e os protegia quando os pais se tornavam muito agressivos. Um dia, 27 | LEVANTE