Jornal do Clube de Engenharia 603 (Junho de 2019) | Page 7

Junho DE 2019 Desafios para o Brasil No final de maio, a Anatel regula- mentou o uso das faixas de 2,3 GHz e 3,5 GHz para o 5G. A expectativa é que um leilão para uso comercial dessas frequências seja feito apenas em 2020. “Novos dispositivos mó- veis terão que ser colocados no mer- cado, novas antenas, novos sensores e novos sistemas serão necessários. Caso o Brasil se disponha a desen- volver essas tecnologias no país, seria um passo bastante interessante, para não ficar como um mero montador de desenvolvimentos alheios, um importador de tecnologia”, registra Patusco. A janela de oportunidades encontra, no entanto, grandes desafios. Além do relativo atraso na adoção comer- cial do 5G, o Brasil tem uma indús- tria nacional de desenvolvimento de telecomunicações muito incipiente se comparada à de outros países, principalmente a China. “Atualmen- te o Brasil não dispõe de estrutura adequada para o desenvolvimento de produtos para o 5G. Com a privati- zação ocorrida em 1998, a indústria nacional se desmantelou, e hoje é responsável por parcela ínfima dos fornecimentos com cadeia produtiva nacional para o mercado interno. A indústria eletroeletrônica tem déficits anuais de cerca de dezenas de bilhões de dólares na balança comercial com outros países. So- mente com uma nova formulação de políticas públicas de incentivo ao setor poderá haver mudanças sig- nificativas no atual quadro”, afirma Marcio Patusco. Para Márcio Girão, será necessário revisar toda a legislação de teleco- municações no Brasil, especialmente no que diz respeito à tributação dos serviços do setor, além de buscar formas mais eficazes de distribuição de radiofrequências para a operação comercial do 5G. “O Brasil necessita realizar os ajustes regulatórios e le- gais. Somente assim poderá acom- panhar o desenvolvimento projetado nas grandes nações do primeiro mundo, como os EUA e China”, aponta ele. Além da indústria nacional, o 5G poderia ser uma estratégia adicional para que o Brasil reestruture suas políticas de inclusão digital. O país ainda está atrasado no primeiro Atualmente o Brasil não dispõe de estrutura adequada para o desenvolvimento de produtos para o 5G. Com a privatização ocorrida em 1998, a indústria nacional se desmantelou. passo da inclusão, que é universa- lizar o acesso à Internet em banda larga, de qualidade, para todas as pessoas. Trata-se de um desafio perene, e políticas públicas recentes, como o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégi- cas (SGDC), lançado em em 2017, ainda encontram dificuldade institu- cional para cumprir seu papel. Para Marcio Patusco, a falta de incentivo público nesse sentido deve fazer com que o 5G se torne mais uma tecnologia cuja adoção é guiada pelo lucro. “Com o 5G as velocidades de acesso aumentarão, mas obviamente que o esforço para disseminação da tecnologia irá começar pelos centros de maior desenvolvimento econô- mico, onde o retorno financeiro para as prestadoras de serviço seja mais vantajoso”, lamenta. “Pouco deve al- terar, portanto, na universalização do acesso em áreas mais carentes ou em áreas rurais, onde hoje se encontram nossas deficiências”. FancyCrave1/Pixabay Mais que uma evolução das tecnologias de transmissão móvel de dados, o 5G promete revolução para o mercado de telecomunicações. Preocupações com a saúde Na margem do debate otimis- ta sobre a revolução do 5G está a preocupação com a saúde das pessoas. Em setembro de 2017, um grupo de mais de 180 cientis- tas de 36 países enviou uma carta aos dirigentes da União Europeia alertando que a tecnologia 5G iria aumentar a exposição dos seres humanos a campos eletromag- néticos de radiofrequência (RF -EMF na sigla em inglês) em va- lores significantemente acima das tecnologias anteriores. O grupo pedia que mais estudos indepen- dentes fossem feitos antes que o 5G fosse liberado comercialmen- te no continente. Para Marcio Patusco, trata-se de um debate necessário. “Como alertado por entidades médicas e por cientistas de várias partes do mundo, existem razões bastante fundamentadas para que a im- plantação do 5G seja acompanha- da de perto através de testes no organismo humano, nos animais e vegetais. Está comprovado que as ondas milimétricas afetam estes organismos vivos, e na incidência que se prevê para o 5G poderá ser um risco que deve ser avaliado”. “Para se ter uma ideia dessa ex- posição, com as altas frequências a serem adotadas para Internet das coisas (IoT), carros autônomos, na indústria 4.0 e acesso a demais aplicações, estima-se que em uma área urbana de um quilômetro quadrado seria necessário um mi- lhão de antenas, e cada dispositivo móvel teria oito antenas. Portan- to, estudos mais aprofundados e criteriosos sobre seus impactos certamente precisam ser realiza- dos”, conclui Patusco. 7