Jornal do Clube de Engenharia 599 (Fevereiro de 2019) | Page 6

O PAÍS Catástrofe tem repercussão internacional e alerta o Brasil para técnicas mais seguras Três anos depois, o Brasil se choca novamente com tragédia semelhan- te. No ranking dos desastres brasi- leiros, a sensação é de que Mariana se repetiu: no dia 25 de janeiro deste ano, também no interior de Minas, em Brumadinho, rompeu outra bar- ragem de rejeitos de minério, per- tencente à empresa Vale – uma das acionistas da Samarco. Os quase 12 milhões de metros cúbicos de lama arrasaram casas, fazendas e pousadas pelo caminho. Até o fechamento desta edição eram 182 vítimas fatais e 126 ainda desaparecidas. O país foi tomado por um forte sentimento de que nada mudou. Ainda sob o impacto da tragédia, o Clube de Engenharia, em nota públi- ca, registrou o empenho da instituição em debater a segurança de barragens no país, tendo inclusive participado da concepção da Lei Federal 12.334, de 20 de setembro de 2010, que estabele- ceu a Política Nacional de Segurança de Barragens. No documento, a cons- tatação de que a legislação pouco fez avançar os procedimentos do Poder Público Federal e Estaduais: “Sob a alegação de dificuldades orçamentá- rias, fragiliza-se o corpo técnico dos órgãos públicos, em quantidade e em qualidade.(...) É necessário, pois, 6 apurar as responsabilidades técnicas, de profissionais das áreas pública e privada, para retirar os ensinamentos do ocorrido e tomar providências para que não mais ocorram”. Consternação e indignação O Serviço Geológico do Brasil – CPRM, empresa pública vinculada ao Ministério de Minas e Energia, recebeu manifestações internacionais da maior parte dos Serviços Geoló- gicos do mundo. Além das manifes- tações de solidariedade ao povo bra- sileiro e condolências aos atingidos, as mensagens foram unânimes em registrar o impacto que essa tragédia provocou na indústria mineral mun- dial, em decorrência da quantidade de vítimas e da extensão do impacto no meio ambiente, comprometendo seriamente os recursos hídricos. O impacto em termos nacionais é incomensurável, envolvendo o setor mineral brasileiro, que responde por 5% do PIB nacional e assegura 200 mil empregos diretos e indiretos e a maior empresa de mineração do mundo. Foi neste contexto que, consternado, o país aguardava medidas concretas na apuração dos fatos e na identificação e punição dos culpados, que se noticiou a prisão dos engenheiros André Jum Yassuda e Makoto Namba, há mais de 30 anos membros da Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (ABMS), o que levou a instituição a se pronunciar publicamente em defesa dos profis- sionais, de elevada reputação no meio técnico e científico. A razão da indignação: foram encar- cerados sem direito à defesa, sem que Em 2015, uma barragem de rejei- tos de minério da empresa Samar- co rompeu na pequena cidade de Mariana, interior de Minas Gerais, causando o maior desastre ambiental da história do país. Um mar de 62 milhões de metros cúbicos de lama tóxica destruiu três distritos, matou 19 pessoas e poluiu seriamente o rio Doce. Sobreviventes vivem hoje com doenças de pele e respiratórias causa- das por metais pesados no ar. sua culpabilidade fosse legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe fossem asseguradas. O que se exigia naquele momento era que o princípio demo- crático da presunção de inocência fosse respeitado e a garantia de um processo de investigação que cumpris- se os requisitos legais e fosse transpa- rente, respeitando os direitos individu- ais dos profissionais envolvidos. Indústria extrativa em xeque Em entrevista para a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o pesqui- sador Rodrigo Salles Pereira dos Santos, do grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (PoEMAS), da Universidade Fede- ral do Rio de Janeiro, foi categórico: “Vários pesquisadores já apontavam isso e, a partir do desastre de Maria- na, a concentração de estudos nesse setor produziu quase um consenso de que o desastre cometido pela Samarco não tinha sido um episódio esporádico e sim uma representação do modo como a indústria extrativa brasileira operava”. Os alertas não começaram somente depois do primeiro episódio. Ainda em 2010, pesquisa do mestrado pro- fissional em Engenharia Geotécnica da Universidade Federal de Ouro Preto já advertia para a necessidade de mudanças no gerenciamento da Bar- ragem 1 da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, que acabaria por se romper quase uma década depois. Além das investigações e análises técnicas é fundamental estudar a dimensão econômica da mineração para entender os desastres recentes. O pesquisador Washington Pirete da Silva, na dissertação “Estudo do potencial de liquefação estática de uma barragem de rejeito alteada para