Jornal do Clube de Engenharia 576 (Março de 2017) | Page 6

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o país

Saneamento : “ um dos segmentos mais atrasados da infraestrutura brasileira ”

O saneamento básico avança , mas não o suficiente para garantir saúde e qualidade de vida para um grande contingente da população brasileira .

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O ano de 2017 começou com a divulgação de um estudo da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental ( Abes ), baseado em informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2015 ( PNAD ) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ( IBGE ). A fria linguagem dos números desenhou um triste cenário , que se não mais surpreende a sociedade brasileira , a mantém em estado de alerta para as graves consequências do quadro atual .
No Brasil , 69,2 milhões de pessoas não têm acesso a esgotamento sanitário ( 34,7 % dos domicílios ), 29 milhões não têm acesso a abastecimento geral de água ( 14,6 %) e 20,5 milhões à coleta de lixo ( 10,2 %). Com relação a 2014 , cerca de 700 mil domicílios deixaram de utilizar fossa séptica não ligada à rede coletora ou fossa rudimentar , passando o percentual de domicílios nessas condições de 34,4 % para 32,7 % em 2015 . Taxa que vai a 67,4 % se somados os domicílios sem qualquer esgotamento sanitário . Ou seja , menos da metade dos domicílios brasileiros está ligada à rede canalizada , propiciando a proliferação de doenças como zika ou chikungunya , como adverte o estudo da Abes .
Na opinião do presidente da entidade , engenheiro Roberval Tavares de Souza , os dados mostram que o saneamento ainda “ é um dos segmentos mais atrasados da infraestrutura brasileira ”. Ele observa , por exemplo , que , atualmente , há mais escolas públicas com acesso à internet do que com saneamento :
41 %, contra 36 %, respectivamente . O presidente da Abes não desmerece a relevância do acesso à internet , mas questiona o fato de o Brasil ter mais da metade de suas escolas sem coleta de esgoto , um terço delas sem rede de água e um quarto sem coleta de lixo . O quadro atual demonstra a inversão de prioridades por parte dos gestores e evidencia como o saneamento vem sendo relegado nos últimos anos . “ O Brasil precisa urgentemente tornar o saneamento prioridade de Estado e não de governo ”, afirma .
Avanços tímidos
Em meio ao debate , impossível não registrar que a Lei 11.445 , conhecida como a Lei do Saneamento Básico , completa uma década em 2017 . Não há o que festejar , embora a Abes avalie que houve melhora na situação do saneamento no país , mas com avanços muito tímidos em algumas regiões . O total de domicílios conectados à rede de esgoto por canalização ou fossa séptica cresceu 4,5 % em 2015 , na comparação com 2014 , alcançando uma cobertura de 65,3 %. Como sempre , a maior cobertura foi registrada no Sudeste ( 88,6 %) e a menor no Norte ( 22,6 %).
O abastecimento de água expandiu-se 1,5 % de 2014 para 2015 , com 876 mil novos domicílios atendidos , mantendo assim a cobertura de 85,4 % de 2014 . A maior cobertura foi registrada no Sudeste ( 92,2 %) e a menor na região Norte ( 60,2 %). E mesmo tendo aumentado em 1,5 % os domicílios
atendidos pelo serviço de coleta de lixo , a cobertura de 2015 se manteve a mesma de 2014 , ou seja , 89,8 %.
O estudo " Situação do Saneamento Básico no Brasil - uma análise com base na PNAD 2015 " também verificou que , em todas as regiões , com exceção da Norte , cresceu o número de residências que usam filtro de água , somando cerca de 36 milhões , das quais mais de 50 % estão no Sudeste . Em sete anos – na comparação entre 2008 e 2015 –, a cobertura do esgotamento sanitário avançou 6 %, de 59,3 % para 65,3 %, estendendo o acesso à 44,4 milhões de residências , após o atendimento de 10,3 milhões no período . Mais uma vez , o Sudeste acrescentou o maior contingente de domicílios à cobertura : 4,5 milhões .
Sem universalização
A Lei 11.445 , de 2007 , estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico , definido como conjunto de serviços , infraestruturas e instalações de abastecimento de água , esgotamento sanitário , limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem de águas pluviais urbanas . A legislação também definiu as competências quanto à coordenação e atuação dos diversos agentes envolvidos no planejamento e execução da política federal de saneamento básico no País , atribuindo ao governo federal , sob a coordenação do Ministério das Cidades , a responsabilidade pela elaboração do Plano Nacional de Saneamento Básico ( Plansab ).
A lei prevê a universalização dos serviços de abastecimento de água e de tratamento da rede de esgoto . Para isso , planos municipais devem apontar prioridades para investimentos de curto e longo prazo . Como muitos municípios não chegaram a elaborar seus planos , o prazo para sua conclusão foi seguidamente adiado : 2013 , 2015 e 2017 .
Mas nem sempre foi assim . Houve determinado momento no Brasil , quando foi criado o Banco Nacional de Habitação ( BNH ) e por conta disso foi criado o Sistema Nacional de Saneamento , que se avançou muito na questão do abastecimento de água . Isso carreou para o sistema , através inclusive do Fundo de Garantia ( FGTS ) e de outros mecanismos de financiamento , muitos recursos para o Brasil avançar em termos de abastecimento de água . E para isso não foi preciso nenhum plano nacional , nenhuma legislação nova . Foi criado um mecanismo econômico-financeiro para viabilizar os acontecimentos , por volta da década de 1960 . O Brasil cresceu muito e a água chegou aos melhores patamares da América Latina , quando foram criadas as empresas estaduais de saneamento , como a Cedae .
Quem faz o relato é o conselheiro e ex-professor da Escola Politécnica e profissional da área , Luiz Edmundo Horta Barbosa da Costa Leite , que questiona : “ Por que o Brasil não avançou mais ? Na questão da água , houve um mecanismo no qual