Jornal do Clube de Engenharia 572 (Novembro de 2016) | Page 7

atividade exploratória apontam no mesmo sentido. O abandono da exploração é a véspera da queda na produção. Não fosse o excelente desempenho no Pré-Sal, que já é responsável por mais da metade da produção nacional, a situação seria ainda mais alarmante, pois o Brasil importaria hoje cerca de 400 mil barris de petróleo por dia. Fragilidade e dependência Reconhecida pela excelência de seu corpo técnico, a redução do pessoal através de Planos de Demissões Voluntárias e a suspensão de novos concursos deverá deixar a empresa cada vez mais dependente de prestadoras de serviços. Simultaneamente, a preservação da memória técnica se perde. A venda de ativos, usual na indústria de petróleo, vem sendo defendida como saída possível para a crise da empresa, o que causa espanto, uma vez que a empresa tem aberto mão de ativos estratégicos aqui, em detrimento dos ativos no exterior. A venda da participação da Petrobras no campo de Carcará, um dos melhores do Pré-Sal, foi um desses casos. A pergunta que não quer calar é por que, por exemplo, a companhia não se desfaz dos ativos no exterior, adquiridos antes da descoberta do Pré-Sal? O maior ativo da Petrobras, associado à competência de seu quadro técnico, responsável pelas suas reservas de óleo e de gás, é o mercado interno brasileiro, onde a empresa investiu bilhões de reais na construção de oleodutos, gasodutos, terminais, fertilizantes, petroquímica e retalho de combustíveis. Vender ou abrir participação nesses bens é destruir a integralidade do sistema industrial da empresa e sacrificar a sua sustentabilidade em longo prazo, o que implicará perda do valor de mercado da empresa. Ainda na visão dos críticos a dívida da empresa é mais uma questão política que financeira, bem como as escolhas das ferramentas usadas para combatê-la. Boa parte da dívida poderia ser contornada se os desenvolvimentos pretendidos fossem momentaneamente parados. É uma questão de soberania e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) deveria garantir que a Petrobras não perderia as concessões por postergar o desenvolvimento de alguns de seus campos. Só isso já daria enorme alívio ao caixa. A venda de parte das reservas no exterior também resolveria a questão. A dívida estaria paga e ainda aumentaria o capital do Estado dentro da Petrobras. Na perspectiva de aprofundar o debate e confrontar opiniões e saídas para os problemas nacionais no setor, o Clube de Engenharia criou a Divisão Técnica Especializada de Petróleo e Gás. Na perspectiva de fazer crescer a interlocução com a sociedade, a partir da reunião de especialistas em diversas áreas, seminários e debates se sucedem para ampliar a discussão e deixar claras as propostas em pauta no Plano de Negócios e Gestão 2017-2021 da Petrobras. É preciso esclarecer o que se pretende, por exemplo, com as parcerias, celebradas como “a pedra de salvação” do novo plano. Ao longo de sua história, a Petrobras construiu um arcabouço técnico e teórico de conhecimentos sem par entre as petroleiras do mundo. Capacitar parceiros, nesse cenário, pode significar a apropriação desses conhecimentos por concorrentes estrangeiras. O país viveu – e não perdeu a memória – a campanha "O Petróleo é Nosso"no início dos anos 50 (ver quadro). Mais de seis décadas depois comemorou orgulhosamente a descoberta do Pré-Sal, visto como “o passaporte para o futuro”. No momento em que as recentes mudanças são anunciadas, o Clube de Engenharia reúne especialistas, juristas, gestores públicos, economistas, geólogos, empresários, academia e entidades de áreas afins para aprofundar o debate. A proposta é esclarecer e entender as reais razões que levam o atual governo a dar uma guinada tão alarmante nos rumos da Petrobras. Uma campanha que o Brasil não esquece A campanha do petróleo movimentou o Brasil a partir de 1947, com o fim da II Guerra Mundial e a derrubada da ditadura do Estado Novo. Contra ela estavam os setores liberais, chamados de “entreguistas” pelos grupos nacionalistas, para os quais a independência econômica deveria ser um complemento da liberdade política trazida por um crescente processo de democratização. O caminho passava necessariamente pela exploração do petróleo brasileiro. Foi longa, dura e repleta de polêmicas a fase de construção do anteprojeto e da discussão no Congresso do projeto do Estatuto do Petróleo. Os frutos começaram a ser colhidos quando a campanha ganhou as ruas e o país, sob a liderança do Foto: Jônio Machado NOVEMBRO DE 2016 Plataforma auto-elevatória / Espírito Santo Centro de Estudos e Defesa do Petróleo. A presidência de honra coube ao ex-presidente Arthur Bernardes. O Centro de Estudos passou a coordenar as atividades em todo o país, já que, até então, as manifestações eram desorganizadas. Com apoio da União Nacional dos Estudantes foi organizada extensa agenda. Entre elas, a semana e o mês do petróleo. Na época, o país vivia um boom de desenvolvimento econômico e a indústria do petróleo precisava acompanhar esse cenário. Em 1950, o consumo do combustível praticamente triplicara, passando de 34 mil barris para 100 mil. No ano seguinte, o presidente Getúlio Vargas lançou um projeto de lei para a criação da Petrobras. Depois de quase dois anos de novas batalhas no Congresso, a lei foi aprovada no Senado e sancionada pelo presidente em outubro de 1953. 7