IFSP Jundiaí 1º Semestre de 2017 | Page 4

A modernidade e a pintura inglesa no século XIX

Segundo o grande historiador italiano Giulio Carlo Argan, a arte moderna pode ser entendida como um desdobramento da cultura Iluminista. Os acontecimentos sociais e políticos inspirados por esta corrente de pensamento reverberaram por toda a Europa como uma ruptura histórica radical, tendo como ápice as convulsões revolucionárias na França a partir de 1789. A virada do século XVIII para o XIX convive com as aspirações de um mundo ordenado pela razão e simultaneamente atravessado pela paixão própria que envolve os momentos revolucionários. A modernidade significou uma mudança na maneira pela qual os homens compreendiam as relações com o tempo, com o espaço e consigo mesmos. Pela primeira vez na história, seguindo a tradição revolucionária da busca pela liberdade e movida pelo conceito de democracia, abria-se para o homem europeu a possibilidade até então inimaginável de que seria possível e até mesmo inevitável a utilização da Razão para reordenar a realidade.

Nas artes plásticas as alterações dos padrões estilísticos também se fizeram sentir, com igual impacto, nas formas de figuração da pintura. Na Inglaterra, um dos mais notáveis exemplos desta nova tendência de notação visual foi o místico William Blake (1757-1827). Suas pinturas são marcadas por um processo de criação subjetivo. Blake buscava em seu trabalho, que incluiu uma sólida produção literária, construir uma comunhão sublime com o universo. Para tanto usava como principal referência imagens mentais que apareciam a partir de seu “olho interior”. Nesse sentido, estamos muito distantes das regras acadêmicas herdadas da tradição renascentista clássica, cujo olhar construído a partir da perspectiva, tratava de representar sistematicamente o espaço real tridimensional através de uma abstração matemática. Em total oposição a isso, seria possível dizer que William Blake é um dos pioneiros de uma tendência de contestação radical dos dogmas herdados, cuja força romântica pode ser sentida em toda a pintura inglesa do século XIX.

É desta força, mescla de modernidade e romantismo, que se nutre o mais famoso pintor inglês do século XIX, Willian Turner (1775-1851). Em contraposição a Blake, seus quadros remetem a paisagens cuja inspiração vem da realidade natural, mas sempre recobertas de uma visão fantástica e pessoal, como se agora o espaço precisasse de camadas subjetivas de interpretação. Turner, de certa forma, nutriu uma relação ambígua com a tradição, procurando, ao longo da vida, salientar sua ligação com a Academia Real, onde, por sua vez, fazia bastante sucesso, na mesma medida em que se esmerava em superar os dogmas clássicos da pintura. Além de seu grande sucesso na Inglaterra, onde será consagrado como um dos maiores artistas de todos os tempos, fato raro em sua geração, seus recursos técnicos aliados a sua imagética poderosa consolidarão Turner como uma influência fundamental do romantismo francês.

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