Hatari! Revista de Cinema #06 Cinema Nórdico | Page 17

Rock , GALINHAS, PRETENSÕES E REYKJAVÍK por Pedro Fávaro 33 Luzes piscando, sons esquisi- tos, não dá pra saber muito bem o que está acontecendo. Era pra ser um show de alguma banda, mas está parecendo mais uma instala- ção que um show. Quem assiste, porém, parece ser uma plateia de um show, com cervejas nas mãos, rindo, meio perdidos. No palco, de- morei um pouco pra entender, mas estão ali três islandeses desmiola- dos decapitando galinhas vivas e alguma outra ave parecida, em o que parece ser uma grande guilho- tina de papel. Um tempo depois, a polícia chega e a agitação para. Ninguém parece ter sido preso, mas a presença da polícia dispersa a pla- teia e o show acaba. Logo depois, dando entrevista enquanto senta- dos no palco, a banda fala algumas poucas coisas para a câmera. Um de- les, brincando com o corpo de uma galinha, solta: “Se é permitido ani- mais morrerem em um abatedouro, por que não em uma obra de arte?”. Esse é o trecho mais dife- rente de Rokk Í Reykjavík (1982), de Friðrik Þór Friðriksson. Até en- tão (e a partir daí), ele é um regis- tro praticamente simpático sobre a cena de rock islandês entre 1981 e 1982, claramente entorpecida pela lógica punk do “do it yourself” e da loucura inconsequente ado- lescente. O filme é basicamente uma coletânea de apresentações ao vivo de 18 bandas e um poeta islandês. Essas apresentações são preenchidas com depoimentos de algumas bandas que vamos ver ou já vimos tocar, ou algum membro delas. Na cópia que assisti, os no- mes das bandas e de suas músicas aparecem através da legenda, mas não há nada impresso na película. Sobre esse trecho da decapitação das galinhas, a única informação que me apareceu através das legen- das foi de que a “banda” se chama Bruni BB, mas aparentemente ela não existe em nenhum outro lugar, exceto nesse filme, o que a torna anônima quanto se seu nome não tivesse sido revelado. O que mais in- comoda nesse trecho do filme não é a decapitação. É também, mas ela só incomoda mais do que devia por conta da confirmação de que é algo completamente vazio, coisa que se dá no depoimento de um dos rapa- zes. “Por que não em uma obra de arte?”. Tenho uma fascinação enor- me por um tipo de rebeldia adoles- cente, aquela que transborda vida, urgência, paixão, inconsequência e loucura, mas que é também aquela que constantemente se depara com a consequência, com a desilusão e que em todo momento se coloca em crise. Porém, nesse trecho do fil- me e nesse depoimento, me deparei pensando, por um breve momento, que talvez a inconsequência jovem fosse, na verdade, um monte de besteira. Claramente essa perfor- mance não foi pensada com algum motivo, algum porquê. A explicação dada pelo rapaz no seu depoimen- to é nada mais que uma justificati- va forçada, algo que veio depois da ideia inicial de “decapitar galinhas 34