Hatari! Revista de Cinema #06 Cinema Nórdico | Page 13
a “nova” religião foi tendo um espa-
ço cada vez maior naquela cultura, e
com isso, enfraquecendo os valores
de seus guerreiros, que lutavam em
nome dos seus deuses sem temer
a morte, pois o Valhalla 2 estaria de
portas abertas para eles, e por fim,
quem ocupava ainda as terras inva-
didas, como Inglaterra e França, por
consequência se tornavam ingleses,
franceses, e assim respectivamente,
decretando a extinção dos vikings.
Esse breve apanhado histó-
rico é só para propiciar uma con-
textualização acerca daquela ci-
vilização e serve também como
uma introdução para o filme que
aqui será analisado e que compõe
a denominada “Trilogia do Cor-
vo”, que tem a direção do islandês
Hrafn Gunnlaugsson, que nesses
filmes “marginaliza” essa figura
mitológica e romantizada que são
os vikings, trazendo para eles uma
outra imagem, muito diferente da
que é retratada. A trilogia é com-
posta por A Vingança dos Bárba-
ros (ou Quando voa o Corvo) de
1984, A Sombra do Corvo, de 1988
e O Viking Branco, de 1991. Vale
ressaltar que mesmo se tratando
de uma trilogia, ela não tem uma
sequência, com cada um come-
çando uma história e terminando
nela, sem ganchos para partir de-
las, mas que se ligam de alguma
maneira por pequenas questões
e por em todos os filmes aparece-
rem corvos, animal muito atrela-
do a Odin na mitologia nórdica.
A T rilogia do C orvo e a Q uestão
R eligiosa
Uma das coisas mais notáveis
que o tema “Cinema Nórdico”, que
será abordado nessa revista, mos-
trou através de seus filmes, é uma
ligação muito estreita com a religio-
sidade, e usando de diferentes ver-
tentes religiosas para mostrar isso.
Indo em direção a isso, mas ao mes-
mo tempo, indo na contramão, por
mostrar um outro lado do que fora
visto até então, nos filmes que servi-
ram para estudos durante o semes-
tre da revista. O diretor Hrafn Gun-
nlaugsson mostra como a opressão
de uma religião, sendo manifestada
através de seus fanáticos, foi respon-
sável pelo declínio de uma antiga
sociedade, e esse declínio vai se tor-
nando mais evidente em cada filme,
sempre aumentando a dimensão
que é mostrada em cada história .
No primeiro filme, A Vingan-
ça dos Bárbaros, a manifestação
da igreja católica é dada através de
um jovem sem nome, apelidado de
Gest por um dos homens que ele
queria matar. Essa vingança se dá
pois no passado, durante um mo-
mento de descontração com a sua
família, eles foram atacados por vi-
kings que mataram seus pais e se-
questraram sua irmã. O seu destino
também seria a morte, mas foi pou-
pado por um outro viking. Já em O
Viking Branco, que é o terceiro filme
da trilogia, mas que por ordem cro-
nólogica, ele faz mais sentido como
sendo o segundo filme, é mostrada
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a história do Rei Olav Tryggvasson,
que originalmente era um viking,
mas que, durante o seu período in-
vadindo outras terras, acabou se
convertendo para o catolicismo. A
sua promessa para Deus era a de
converter todos os países nórdicos,
como havia ocorrido com ele. Ao
conquistar a Noruega, ele se impõe
a Askur - um jovem que estava se
casando com Embla no momento
em que foram atacados -, por serem
o último reduto de pagãos no país.
Usando sua mulher como objeto de
chantagem, o Rei convence o jovem
a partir em sua “cruzada”. E por fim,
nessa premissa, o segundo filme, A
Sombra do Corvo, já parece se pas-
sar em uma outra situação, não há
resquícios de um outra religião que
não seja a cristã, tanto é que o gran-
de embate se dá, mesmo que não
inteiramente, por uma questão de
poderes, e o mais poderoso é aquele
que tem uma igreja maior, no caso,
o Bispo, pai de Hjorleifur, e antago-
nista do casal Trausti e Isold.
E esse embate que se dá em
todos esses filmes sempre se dá
muito mais no campo da ação do
que no campo do discurso. Nos fil-
mes, o “discurso” é feito na base da
violência, que é crescente de filme
para filme. No primeiro, Gest, um
jovem cristão, trajado como tal, che-
ga até a Islândia buscando por vin-
gança dos assassinos de seus pais.
As suas palavras em todo o decor-
rer do filme são diferentes de suas
intenções, e através disso, ele vai
construindo seu plano até a chega-
da do embate final com Thord (fig.
1), concluido assim o seu ciclo de
vingança. O fato que muito cha-
ma a atenção é a clara inspiração
no filme Por um Punhado de Dóla-
res (1966), dirigido por Sergio Leo-
ne, tudo aqui é muito semelhante,
desde o plano de Gest de fazer seus
dois inimigos se enfrentarem para
assim ter seu trabalho mais “facili-
tado”, e também pela sequência do
duelo final, desde a preparação dos
“heróis” até o derradeiro combate.
F ig . 1
Partindo do ponto de inspira-
ções, em seu segundo filme, Hrafn
vai buscar essa inspiração em um
mito celta, mais precisamente na
lenda de Tristão e Isolda, que no
filme ganham uma pequena varia-
ção em seus nomes, se tornando
Trausti e Isold. Ambos começam
o filme se odiando, por conta de
uma briga por uma carcaça de ba-
leia encontrada encalhada na praia
por um homem da vila de Trausti,
mas que também é cobiçada por
homens da vila do pai de Isold, o
que leva a um conflito. Os dois co-
meçam se odiando. Por conta dessa
batalha, eis que surge a maior refe-
rência ao mito celta, que é o fato de
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