Hatari! Revista de Cinema #05 Ficção Científica | Page 33

ponto de vista dele. No início de sua transformação, Seth tem plena noção de cer- tas mudanças e descobre novas e surpreendentes capacidades sexuais e físicas, assim como sabe que é portador de uma singular espécie de ser. Com o tempo, a incapacidade de associar o velho Seth com o novo acaba levando-o a sua autodestruição. Temos paralelamente a destruição de Seth e o distanciamento en- tre ele e Veronica: quanto mais uma anomalia ele se torna, mais o rela- cionamento dos dois se deteriora, e quanto mais ela busca ajuda-lo, mais alienada se torna com a falta de empatia vinda de Seth. Ao longo desta metamorfose, tanto Brundle quanto Brundlefly coexistem num mesmo corpo que se encontra em um processo de mu- tação, cada um deles lutando pela sua independência. Brundle perman- ece presente o tempo todo, no entanto sua presença é manifestada pela dúvida, melancolia, e transformação e é na escuridão da individualidade de cada um deles que a identidade de Brundle e de Brundlefly é retomada através dos seus estados saudáveis e grotescos de manifestações. O realizador canadense levanta questões extremamente impor- tantes em diversos de seus filmes, no entanto, uma das mais pertinentes seria: pode um corpo existir num estado consciente independentemente da mente? Dentro desse artigo eu gostaria de dizer que sim. Que os film- es de Cronenberg fornecem essas mutações por meio de um cinema que procura deixar em evidência o corpo como identidade humana. Max e Seth têm seus corpos mutados em algo independente, desenvolvendo hábitos e novas habilidades, e a morte de ambos surge em virtude do conflito entre a consciência e os novos corpos deles. Os personagens de Cronenberg lutam para aceitar seus corpos transmutados num intuito de buscar uma nova forma de existir, ainda que quase sempre terminem em morte ou suicídio é sempre bem apresentado o esforço e fascínio desses personagens que buscam o renascimento ou a redenção. A Mosca levanta a antiga discussão do pânico em torno da perda de identidade dentro de uma sociedade contempôranea, o medo transfor- mado em algo grotesco. Temos cenas aterrorizantes de um cientista que sofre de uma desintegração física e psicológica chegando a colecionar 33