Hatari! Revista de Cinema #05 Ficção Científica | Page 34
em seu banheiro seus restos humanos em uma tentativa desesperada de
reter em suas mãos algo de sua humanidade.
Os filmes de Cronenberg mostram uma ansiedade e um fascínio com
essas transfigurações corporais e por trás da negatividade e do pessimis-
mo, seus filmes retratam medos e ansiedades reais da sociedade de sua
época com as inovações tecnológicas e máquinas que emergem entre as
décadas de 80 e 90. Ainda que Cronenberg demonstre mais uma vez sua
obessessão com o corpo e mente em A Mosca, não há, em momento al-
gum, sequer uma chance de que Seth poderá renascer.
Cronenberg acaba por quebrar o estigma do corpo, uma vez que
ele não o vê como algo fechado e acaba se focando só nele, mesmo se
tratando de algo em constante processo de transformação. É o corpo, a
carne e a mente que acabam sendo o centro de quase toda a filmografia
do realizador, assim como a figura de seus cientistas que, com o intuito de
criar algo bom, acabam por criar algo que lhes foge do controle, sempre
sendo as cobaias de seus próprios experimentos, afetando corpo e espíri-
to, traçando uma cruel narrativa de autodestruição.
O realizador canadense mostra por trás de todas as cenas grotes-
cas a face oculta que se manifesta em todos nós, são personagens que sof-
rem crises de identidade fora do controle e que não conseguem escapar
dos destinos que eles mesmos tecem. É em meio a todo o sangue que
podemos observar os olhares de terror, inquietação e paranoia, a obsessão
de seus personagens em busca de se tornarem novos seres, a fim de su-
perar a carne e a alma que possuem. Não existem chances de redenção no
cinema de David Cronenberg.
Por Yasmin Gabrielle Rahmeier Souza
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