Hatari! Revista de Cinema #04 Cinema Brasileiro Anos 80 | Page 69
referência assumida à famosa sequência de dança de A Roda da Fortuna,
com Cyd Charisse e Fred Astaire, Marta Brum e Fred dançam no MASP,
envolventemente.
Aliás, envolver é o verbo de Marta Brum. A personagem de Marília
Pêra, apesar de não ser minha favorita - posto que pertence a Lola -, é,
sem dúvidas, a mais envolvente do fi lme. Em cada cena que está presen-
te, seus movimentos falsos e exagerados são capazes de aproximar ainda
mais o espectador, por mais paradoxal que isso soe.
A relação de Marta com a realidade também é bastante interessante.
Por seus movimentos que parecem ensaiados - como se ser atriz não fos-
se apenas sua profi ssão, mas um modo de viver -, mas principalmente
pelo modo como lida com a falsidade, como se fosse natural. Isso está
presente em suas ações, na cena de dança, na dramaticidade colocada na
ação de pedir um táxi, nas pérolas falsas e culmina quando ela se utili-
za de uma ferramenta cinematográfi ca para se locomover: “Vamos fazer
como no cinema, quando eu contar até três você fecha os olhos”. Ela saiu
das telas da TV e dos palcos propriamente ditos, mas aparentemente seu
palco não termina na beirada de um tablado em um teatro. Seu palco é o
mundo inteiro.
A autorreferência e a utilização de metalinguagem também são ele-
mentos constantes no fi lme. Ruas que são teatros. Teatros que são apar-
tamentos. Atores que interpretam atores. Crimes que são encenados. Ou
não são? Na primeira cena do fi lme, há uma peça de teatro sendo ensaia-
da. Na cena, um personagem está morto na banheira de um apartamento.
Mais tarde, em um apartamento igual ao cenário da peça, vemos a mesma
situação. Há ainda, no início do fi lme, um assassinato em um engarrafa-
mento. CORTA!. ”Aposto que é mais uma porcaria que andam fazendo
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