Fluir nº 8 - Novembro 2021 | Page 36

36 do Sr . Armindo se espraiasse , ultrapassando os doze minutos regulamentares , fixados ninguém sabe muito bem por quem . A supervisora a deixá-la ir fumar um cigarro depois de um telefonema mais duro . Os filmes que me tocam e em que não há assassinos em série nem piratas informáticos nem atiradores especiais . O momento em que o Júlio interpelou a « Siri » e a máquina não percebeu a ordem e ele teve de a reformular e a máquina tornou a não perceber e ele se mostrou perdido e finalmente humano . O final do texto do Humberto Brito , que é o excerto de uma carta dirigida à mulher , a Djaimilia Pereira de Almeida : « Tu , eu , toda a gente em todo o lado , Cruz de Pau ou Nova Iorque , todos em lista de espera no longo processo de avaria . E então comecei a ver isso — a anonimidade da avaria — em todos os lugares por onde fosse , em cada coisa , em toda a gente , na minha própria vida . Sinto a tua falta . Volta depressa .» E as últimas frases do telefonema do Tiago : — Sei que falhei por completo . Mas acho que não vou falhar outra vez . Se calhar , não foi assim tão grave . Pelo menos , o Wolfgang conseguiu escreverme um email do hospital . Mas prometi a mim próprio que , se tornar a acontecer uma coisa parecida à minha frente , não terei medo de ficar para sempre inscrito na vida do outro . Esta minha recolha de momentos mágicos tanto pode ser a colheita das últimas aparições de uma espécie em extinção como um catálogo das primeiras ocorrências de um novo fenómeno a despontar no mundo . Há dias em que me parece aquilo e há dias em que me parece isto . Dias de negro desespero e dias de esperança radiosa . E os mesmos sinais ora me desalentam , ora me ajudam a continuar .