O mês de agosto
Diana Brígida Correia
O mês de agosto, os cristais e as bolhas
efervescentes que sobem pelo copo de vidro e que
deixam a desejar a frescura de mais uma dose de
bramble com gelo picado e molho de limão. A
dispersão de luz ofuscante pelas águas de cor azul
celeste com o brilho em diamante ondulando
conforme o vento. O açucareiro entreaberto, as
tábuas de queijo da serra, a paisagem do areal ao
longe, duas cadeiras verde-água que vieram de
Espanha. A tarde que já se torna serão, o silêncio
da noite, as pernas entrelaçadas na rede, os
talheres usados deixados à beira da travessa, os
risos vindos do outro lado do jardim. O filho mais
velho que fechou o livro que já andava para ler
desde o Natal e se deixou cair no banco de jardim.
A introspeção que vai ao encontro a um poema que
tinha analisado há uns anos de Pessoa, ortónimo:
“Já não sei de onde vim nem onde estou/ De o não
saber, minha alma está parada". O rapaz encostou-
se nas costas do banco e fechou os olhos, à espera
de recuperar o sono perdido das noites com os
amigos, mas os versos que se recorda de ter lido
em voz alta numa aula de língua portuguesa há
quinze anos continuam à espera de ser
reinterpretados. O passado, a infância e as
experiências que o fizeram ser quem é. Entretanto,
os primos mais afastados que estavam a jogar às
cartas na mesinha de apoio do jantar entraram em
casa e subiram para o segundo piso, o que o rapaz
42 observou pelas luzes que vê serem ligadas e pela
mãe deles que os avisava de alguma coisa. O filho
deu uns passos à frente, devagar, e sentindo o
cansaço a apoderar-se dele. Pegou num jogo de
tabuleiro mal-arrumado em cima de uma manta e
levou-o consigo, sentando-se de novo. Organizou
as peças e releu as regras do jogo, lembrando-se
das dezenas de vezes que o tinha ganhado.
Recordava-se perfeitamente dos momentos que
passara naquele jardim a jogar aquele jogo, mas
havia brechas impreenchíveis que não conseguia
recuperar. O sentimento de glória de quando se
levantava de braços no ar gritar vitória, do
entusiasmo, da adrenalina que sentia quando era
desafiado nas brincadeiras de criança. Pousou o
tabuleiro no chão e olhou para o relógio, num
suspiro de apreensão. As dificuldades diárias do
seu emprego e da sua vida familiar eram como um
labirinto que tinha sido autonomizado da
comodidade encontrada quando criança. Mas a
nostalgia que sentia tinha em conta o passado em
absoluto ou era um desejo de recuperar e moldar
algo que já passou conforme os óbices do
presente? Era uma rejeição da imperiosidade da
passagem do tempo, da irrecuperabilidade do
momento exatamente como foi? O rapaz,
resistindo ao cansaço e à melancolia, olhou para o
céu estrelado e imaginou o Universo em seu redor.
Pensou em vários momentos soltos do seu passado
e em como não os poderia recuperar. Quando
sentiu fome, já de madrugada, foi buscar tostas