Fluir nº 1 - setembro 2018 | Page 9

Fluir nº1 - Renascimentos - 2018 lado, um lugar que me pergunta onde estou e não responde. O anoraque está pousado em cima do tapete no chão da casa que é esta, a casa que eu conheço. As almofadas que me seguram ainda estão na cama onde agora durmo e acordo. O anoraque, a ambulância, o tapete, as almofadas, eu, entre os dias passados e o dia em que nasci pela segunda vez. O lugar, afinal, respondia, eu é que ainda não sabia ouvir. Estás aqui, na tua casa verdadeira, com o teu nome verdadeiro. Mamã, foste tu que tiraste a fotografia? Não, foi o teu pai, eu estava mesmo ao lado dele. Só as borbulhas têm cor, na fotografia, eu não tenho cor nenhuma, pareço feito de cera. Não apanhavas sol, na tua primeira vida. Preferia não ter tido essa vida. Tens razão. Mas agora fica aqui guardada. Só vens visitá-la quando quiseres. Nunca mais quero abrir essa gaveta. Ainda não abri a gaveta. Talvez quando for crescido, quando tiver a força do Super Homem. A ambulância amarela está aqui, posso esconder-me nela sempre que quiser. Acho que tive sorte por ter nascido duas vezes e continuar eu. 9