Um dos diversos Muriquis que
passaria a observar diariamente
A seleção e o primeiro encontro com os muriquis
Entre aviões, ônibus, caronas e alguns
poucos quilômetros de caminhada com minha
mochila, chego à RPPN FMA para participar da
seleção (Ufa!). Logo na entrada da reserva observo
que o topo das árvores de ambos os lados da estrada
são conectados, causando a impressão de estar
entrando em um túnel misterioso e
predominantemente verde. Sigo caminhando,
atento a cada detalhe. Em poucos minutos vejo uma
serpente verde deslizando sobre os arbustos; um
pouco mais a frente escuto a imponente vocalização
de um bugio, me trazendo a sensação de estar em
um ambiente realmente selvagem. Caminhei cerca
de 30 minutos até chegar à casa dos pesquisadores
vigentes, André Ferreira, Marlon Lima, Tatiane
Cardoso e Carla Possamai, que viviam no local há
nove meses e, além de monitorar a população de
muriquis, eram também os responsáveis pela
seleção dos novos pesquisadores para o projeto.
No dia seguinte fui acompanhar o trabalho
que eles realizavam e me recordo como se fosse
ontem: era 24 de fevereiro de 2011, uma quinta-feira
de um verão demasiado quente. Desde as 7h,
Marlon e eu caminhávamos pelo relevo acidentado
da Floresta Atlântica na RPPN FMA à procura de
um grupo de muriquis-do-norte. O relógio já se
aproximava do meio dia e a floresta estava
silenciosa, com exceção dos ruídos do meu
estômago e o constante zumbido de algumas dúzias
de mosquitos bioluminescentes. Marlon me alerta
que os muriquis estão próximos, dizendo que
conseguia sentir o cheiro deles (pensei: “um dia
quero ficar assim”).
Subitamente o silêncio que imperava é
interrompido pelo barulho de intensas vocalizações
semelhante ao relincho de um cavalo, seguido pelo
som de galhos sendo quebrados. Eis que um
distinto macaco, de pelagem espessa e acinzentada,
braços e pernas longas, além de uma enorme cauda
preênsil, surge na copa de uma imensa figueira e
fica a nos encarar. Segundos depois, 10 outros
indivíduos se unem ao primeiro e, pendurados em
um galho pela cauda, se amontoam uns sobre os
outros formando um imenso cacho de muriquis
“relinchando” sem parar. Fico perplexo, não
sabendo muito bem como agir, afinal, era a primeira
vez que ficava frente a frente com o maior primata
das Américas, e um dos animais mais ameaçados de
extinção do planeta.
Foi um encontro emocionante e, a partir
deste momento, tive a certeza de que gostaria de
estudar a vida dos muriquis pelos 14 meses
seguintes. Tinha em mente que, imerso na floresta e
seguindo diariamente um bando de macacos, eu
teria uma oportunidade única de
autoconhecimento e me sentiria mais vivo e estaria
mais próximo do que realmente é importante na
vida. Eu estaria vivendo a vida da floresta... A vida
dos muriquis!
E x p l o r a W e b M a g a z i n e 16