ebook_curadoria_digital_usp.pdf Curadoria Teste - May. 2014 | Page 89
3. Você diria que além da rotina de cortar texto, que é uma característica mais do jornalismo mesmo,
que há um hibridismo de funções que consiste em adicionar um percurso e dar um contexto a todas
essas matérias que vem da pesquisa e que são características da curadoria no sentido de agregar
contexto a um percurso?
HF: Isso a gente faz o tempo inteiro. Às vezes a matéria chega e eu penso “tem que contextualizar melhor para o
público brasileiro”. Dá para contextualizar dentro do texto? Não porque eu vou alterar o sentido; cortar o texto é uma
coisa, alterar é outra. A Michaella Pivetti, que fez o projeto gráfico, criou uma solução, que existe também na Courrier
International, que é ter textos paralelos, uma espécie de rodapé, que a gente batizou mesmo de “nota de rodapé”,
onde pode-se contextualizar ou dar alguma informação a mais. Às vezes tem uma determinada referência que é muito
francesa, muito americana, e eu posso tentar explicar. Esse diálogo eu faço e vou procurar essa referência muitas
vezes na internet e cito. Quando é uma informação mais geral, que está em todos os veículos, não há necessidade de
citar, mas quanto é um tipo de informação que tem uma opinião, um ponto de vista, eu cito.
4. Quais são as habilidades envolvidas nesse processo que envolve processos de curadoria e não
somente o jornalismo tradicional?
HF: A primeira é gostar e ser leitor de jornalismo nacional e internacional e ter uma curiosidade muito grande porque
não estamos nos prendendo em revistas conhecidas, estamos indo atrás de publicações desconhecidas, pequenas
revistas, blogs, onde também circula a informação, como um jornalista que mora em outro país e também está
escrevendo notícias. Ele não é pago por ninguém, mas faz porque gosta e ali tem informações importantes. Primeiro
tem esse desejo de pesquisa: navegar. Estes dias li que com o Facebook diminuiu a navegação mais livre, de flanar
pelos sites e blogs, e que tem funcionado como a grande avenida das informações. O curador deve estar muito
disposto a ir pelas ruelas e becos, porque de repente se cai no blog de uma manifestante na Turquia que tem todas
as informações que você precisa e é um texto de alguém que é um observador privilegiado de um conflito. Para você
entrar nestes lugares tem que ter um conhecimento de algumas línguas, o português, que o básico, inglês e francês.
Terminamos a revista com uma seção “Vale a pena ler de novo”. É uma curadoria mais histórica, ou seja, uma seção
que procuramos publicar na íntegra uma grande reportagem do passado. No primeiro número, por causa do Samuel
Wainer, que é da onde vem o nome da revista, publicamos o encontro dele com Getúlio Vargas. Depois publicamos a
grande matéria do Paulo Patarra na revista Realidade, que foi a entrevista com Luís Carlos Prestes às vésperas do AI5,
em dezembro de 1968. A última foi do do Raimundo Pereira, “Muitos Lulas”, sobre as greves que ocorreram no ABC
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