Dragões #424 Mar 2022 | Page 36

ATUALIDADE
com mais história da Ucrânia – e com um passado muito relevante no quadro do futebol soviético –, o Shakthar dispunha de instalações que Telmo Sousa , coordenador da preparação física dos escalões de formação da equipa de Donetsk entre 2013 e 2015 , classifica como “ brutais ”, tanto ao nível do centro de treinos como do estádio . No verão de 2014 , foi preciso deixá-las . De regresso das férias passadas em Portugal , o atual treinador-adjunto de Sérgio Conceição confrontou-se com uma realidade completamente diferente : “ Na viagem de Dnipro para Donetsk passei por 12 checkpoints , seis pró-Ucrânia e

É uma diferença brutal . Quando se chega a Kiev as pessoas são claramente

pró-ocidentais . seis pró-Rússia . À medida que nos aproximávamos da fronteira entre os dois lados aumentava a intensidade do controlo e do aparato militar . No primeiro nem pediam nada , no segundo já se via alguns carros da polícia , no terceiro tinham armamento mais pesado , nos últimos já havia tanques de guerra e sentia-se a guerra iminente ”. Na cidade , a situação era “ tensa ” e criava “ instabilidade no dia a dia ”: “ Podíamos estar num restaurante , olhar lá para fora e de repente ver passar 10 ou 12 pessoas com kalashnikovs ”. Quando começaram os tiroteios em Donetsk , foi preciso ativar o plano de evacuação para Poltava que o Shakhtar já tinha preparado : “ Só tive tempo de ir a casa buscar as coisas mais importantes . Fomos em três autocarros , escoltados pela polícia , e para fugir aos checkpoints onde havia bombardeamentos tivemos de dar uma volta pelo Sul . Fizemos em 16 horas uma viagem que em condições normais seria muito mais rápida ”. Mesmo tendo passado por esta experiência há quase oito anos , Telmo Sousa não deixou de ficar surpreendido com os acontecimentos das últimas semanas : “ Nunca pensei que isto escalasse assim em pleno século XXI ”. Hoje , a principal preocupação de quem tem ligações à Ucrânia prende-se com as pessoas que ainda lá estão . Vlad Voytso e Denis Podolskyy têm mantido contactos com os familiares que permanecem no país e dão conta de formas diferentes de encarar o presente . A avó e a tia do basquetebolista continuam em Chortkiv e é por lá que querem ficar , até porque , como explica Vlad , nesta altura “ é mais perigoso sair do que ficar em casa ”. Já os parentes de Podolskyy – que , do lado materno , “ sentem-se sozinhos ”, por a maioria dos conterrâneos já ter partido , enquanto do lado paterno lidam há
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