RUI
Deitado. Uma cama individual num quarto vulgar.
Volta-se para ficar com o corpo virado para cima.
Contempla o tecto. Vê aos cantos as manchas de humidade e
bolor que se formaram com o passar dos anos. É uma casa
antiga, num bairro antigo de Lisboa. Repara também na
lâmpada que pende ao centro do tecto, resultado de uma
instalação eléctrica descuidada. Provavelmente houve em
tempos um quebra-luz que envolvia a lâmpada. Talvez. Mas,
o que via era apenas a lâmpada pendurada por fios eléctricos
que saíam do tecto. O tecto era de um branco que já havia
sido branco. Amarelado pela humidade e pelos maus tratos
do tempo. Fora isso, não havia mais nada que lhe pudesse
prender a atenção. O tecto era quadrado, tal como o quarto
que se assemelhava a um cubo exíguo, que por vezes o
oprimia. Mas hoje não.
Volta-se para o lado direito. Encostado à parede está o
roupeiro onde guarda a pouca roupa que possui. Tal como
tudo naquele quarto, o roupeiro ostenta uma idade
indecifrável. Estava ali quando Rui chegou e quase de certeza
iria continuar nesse local depois de ele o abandonar. Não
conseguia perceber qual o material que o constituía. Apenas
notava que já havia sido novo, mas agora parecia ter a idade
das coisas que não conseguimos determinar. Talvez fosse da
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