JOÃO NEVES
pessoas ah que giro Bruno como tu, e tu sorrias de volta e
davas-lhe um calduço, o meu mais velho, dizias com a
segurança de quem garantiu um pedaço da eternidade, e,
agora discordarias comigo mas garanto-te que era assim pai,
muitas vezes já nem me apresentavas a mim e a conversa
mudava para qualquer coisa, ou porque o Bruno isto ou o
Bruno aquilo e eu, ali meio agarrado às saias da mãe,
enconadinho, era o que me chamavas quando a mãe não
ouvia, se ela te ouvisse, não sejas enconadinho, caralho, a
mãe morria logo ali, alguma vez ela disse asneiras pai?
Gostava de te ter perguntado isto, entre outras coisas. Coisas
banais, sabes, coisas simples, dúvidas parvas: coisas que te
fariam soprar para o ar, para uma franja que tinhas apenas
na minha imaginação (espero não ficar careca tão cedo como
tu, pai, sem ofensa), as perguntas que os miúdos fazem
quando estão a crescer. O padre ainda não chegou. Ainda
bem, não tenho grande paciência para a missa. Estou a olhar
para a mãe, está a olhar para o Bruninho (vou referir-me
assim ao teu neto, ao meu sobrinho, para os distinguir senão
depois às tantas já não sabes de quem estou a falar) e está
calada, mas sei o que ouve dentro da cabeça, meu neto, é isso
que ecoa dentro dela, meu neto, os lábios parecem mexer-se
para articular tenuemente aquilo que vai gritando dentro de
si. A mulher do Bruno está com o Bruninho ao colo, vai
abanando-o para ele não chorar, parece que o miúdo se vai
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