NÓS DESFEITOS
Já não conto a ninguém
que oiço o ruído do teu sangue
até nas ervas ondulantes, como
se a tua carne fosse túmulo em
incessante flor. Não visito
os espelhos de fumo em que
rarefeitos oscilamos ainda
entre amar e partir. Ouro
cantante na luz aprilina,
pés forjados em valsa russa
e agora imóveis, é tardia
a palavra regresso, e aqui
tão fundo o sossego.
Tu já não tens de aprender
como se morre — os teus dias
minuciosamente vivos não
têm sobre quem se derramar.
Só a tua sombra se inclina
em busca de outro corpo que
anoiteça e um dia leia para o
mundo com a boca ferida
os epitáfios que achou
dentro da tua.
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