Desfazer as confusões pd52 | Page 184

Górgias, grande professor sofista, também no período demo- crático, exigia de seus alunos que fossem capazes de produzir uma determinada tese, e depois de aprovar a competência do discurso ensejado, cobrava dos discípulos que fossem igualmente capazes de elaborar uma antítese da articulação anteriormente exercitada. Essa capacidade argumentativa foi conhecida na Grécia clássica como dialética, uma competência do profissional da logografia para produzir seu discurso no processo em prol ou contra, conforme fosse o interesse do contratante. A dialética é, pois, uma arte de buscar e revelar ou não as contradições entre as teses discutidas na lide. Muitas vezes o orador utilizava-se das afirmações do discursante para vencê-lo no debate exercitado. Quando Górgias afirmou que a verdade seria relativa, que dependeria de cada indivíduo em sua subjetividade, concluiu o discurso, afirmando que diante disso “nada se pode afirmar sobre coisa alguma”. Sócrates usou as pala- vras de Górgias para dizer: “tu estás afirmando que nada podemos afirmar sobre coisa alguma...”, o que provocou risos e aplausos diante dos ouvintes. A verdadeira arte dialética consistiria em vencer o debate, utilizando-se das palavras enunciadas pelo oponente, vencer o adversário a partir de suas próprias afirmações. Deve-se salientar o compromisso do advogado com o interesse de seu cliente no curso do processo. A verdade ensejada pelo logó- grafo é uma verdade interessante, posto que interessa ao propósito contratado. Não se busca nessa intervenção intelectual, lógica e dedutiva uma verdade objetiva, mensurável, demonstrável, quanti- ficável (própria da ciência ou epistéme) e sim uma produção possí- vel, como certeza argumentativa razoável e verossímil. É tarefa do advogado introduzir o questionamento, a tese de seu cliente, que haverá de ser referida e debatida pelo juiz, quando do Relatório da Sentença. Tal é de suma importância formal, pois a decisão judi- cial poderá ser anulada pelo Tribunal competente, por imprecisão do relatório da causa: os argumentos legais, jurídicos e jurispru- denciais apresentados pelas partes do litígio. Se, na hipótese, o magistrado relatou apenas dois dentre os quatro argumentos de uma das partes, evidentemente não apreciará na ocasião da deci- são os argumentos que ele próprio esqueceu de relatar. O advogado é o mais livre dos profissionais do direito enquanto construtor de um discurso jurídico. Pode transcender logicamente os limites formais instituídos pela legalidade ocasional, pode produzir a hermenêutica da sua conveniência processual (literal, 182 Oscar d´Alva Filho