(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 83
Juremir Machado da Silva
traram em confronto com a polícia. Mas, para usar uma expressão
do sociólogo Raymond Aron, em maio de 1968 a ‘revolução não
pode ser encontrada’. Na década de 1960, a França, como muitos
outros países, está ‘entre dois mundos’: existem restos do século
XIX (o peso do mundo rural, o catolicismo, líderes tradicionais,
moralismo...) Ao mesmo tempo, o país entra em um novo estágio
de modernidade marcado pelo desenvolvimento da sociedade do
consumo, dos lazeres e da mídia. Maio de 68 desafiou o velho
mundo e mudou atitudes e costumes.
Conflito entre tradição e modernidade? Jean-Pierre Le Goff
tinha 19 anos em 1968 e era estudante de filosofia em Caen, no
interior da França. Ele mergulhou na vertigem das manifes-
tações como uma criança que descobre um brinquedo muito
mais divertido do que as aulas sobre os clássicos do pensamento
filosófico. Saiu anarquista do terremoto primaveril. A matu-
ridade, contudo, faria dele um estudioso de maio de 1968 e
um desiludido. A citação feita acima releva as expectativas que
tinha ou passou a ter sobre o ocorrido: a revolução não estava
presente. Que revolução era esperada? Aquela que se aprendia
lendo a bibliografia marxista. A França fervilhava de grupús-
culos trotskistas, maoístas, comunistas de toda ordem e filiação
intelectual. A revolução, portanto, era algo claro e tinha a ver
com a mudança de modo de produção. Ou feria mortalmente
o capitalismo ou não existia.
O maio francês não foi apenas estudantil. Jean-Pierre Le Goff
analisa o desdobramento político do acontecimento a partir do
momento em que a rebelião juvenil se cruzou com manifesta-
ções operárias:
Entre maio e junho 1968 as coisas se moveram rapidamente. A
revolta estudantil foi combinada com uma greve geral, que condu-
ziu a uma paralisia geral do país. Inicialmente, a opinião pública
era principalmente favorável aos estudantes, mas o movimento
de revolta não tinha saída política real. A opinião pública acabou
ficando com medo do aumento dos confrontos e do caos nas ruas.
De Gaulle habilmente jogou com esse medo para tranquilizar a
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