(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 56
A dupla ruptura afetiva com o memorial de 1968...
liberdade de expressão pública era severamente restringida
no país de Voltaire, e com Paris paralisada por uma greve
geral e sacudida por tumultos periódicos durante o mês de
maio, os franceses dependiam de canais de rádio, difundin-
do ao vivo a partir de emissoras situadas fora do país, para
receber notícias sobre os acontecimentos. Faz-se necessário
se desenganar-se das distorções deste Estado conservador,
autoritário e terrorista, o que era em muitos respeitos a França
sob comando do Général de Gaulle.
Portanto, na França o acontecimento foi o de uma classe
operária, que optou pela estratégia da auto-organização singular
dos estudantes, para então rejeitar a ordem hierarquizada de
sindicatos como a dos patrões, disparando em seguida a maior
greve geral na história do país.
Entretanto, a grande maioria dos jovens estudantes enfure-
cidos não inspiravam confiança nesta época, percepção esta que
só se verificou com a passagem do tempo. Diante da expressão
libertária com a qual os jovens se manifestavam, a violência
da repressão da República Francesa não deixou de ser brutal.
O levante popular quase derrubou o presidente militar. O fato
do governo gaullista, e o chef de polícia, o assim designado
“intelectual” Maurice Grimaud (1913-2009), decidir contra
assassinar em massa os manifestantes legou ao establishment
francês uma joia memorial. Ao comemorar maio de 1968 a cada
dez anos – em cada ano! –, comemora-se mais ainda o Estado
francês, seu poder, sua filosofia, seu sangue frio e sua esperteza
política. Assegurou-se a hegemonia da Cidade Luz nos roteiros
de turismo político-cultural para gerações futuras.
Estes eixos juntados nos levam a perceber que pela perspecti-
va de uma revolução cultural, maio de 68 representa uma ruptu-
ra alavancada por uma populosa juventude que estava chegando
à idade adulta, em números nunca antes vistos. Até trinta anos
atrás, seus antepassados se engajavam em guerras constantes
que a dizimava. Após as guerras de dizimação, a economia da
Europa ocidental disparou, os novos confortos encaminhando
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