(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 104

O conceito de espetáculo e seus fundamentos como Debord dá o exemplo de como os trabalhadores foram “humanizados” para tornarem-se consumidores na seguinte tese de sua obra, que é cada vez mais atual: Na fase primeira da acumulação capitalista, ‘a economia política só vê no proletário o operário’, que deve receber o mínimo indis- pensável para conservar sua força de trabalho; jamais o considera ‘em seus lazares, em sua humanidade’. Esse ponto de vista da classe dominante se inverte assim que o grau de abundância atingido na produção das mercadorias exige uma colaboração a mais por parte do operário. Subitamente lavado do absoluto desprezo com que é tratado em todas as formas de organização e controle de produção, ele continua a existir fora dessa produção, aparentemente tratado como adulto, com uma amabilidade forçada, sob o disfarce de consumidor. Então, o humanismo da mercadoria se encarrega dos ‘lazeres e da humanidade’ do trabalhador, simplesmente porque agora a economia política pode e deve dominar essas esferas como economia política. Assim, ‘a negação total do homem’ assumiu a totalidade da existência humana. 34 Não podemos esquecer que Debord acreditava que havia uma maneira de desafiar e acabar com o espetáculo: por meio do détournement, que seria pegar, por exemplo, um outdoor anunciando uma venda e subvertê-lo a uma mensagem com- pletamente oposta – seria usar as armas do sistema contra o próprio sistema. Debord é um revolucionário, não podemos nos esquecer disto, A Sociedade do Espetáculo é tanto um livro de teoria quanto um livro de estratégia, de práxis. Neste sentido, podemos e devemos localizar Debord numa corrente de pen- samente emancipatória. Posteriormente, suas ideias influencia- ram pensadores como Jean Baudrillard, porém, perde-se o lado normativo do pensamento de Debord. Mesmo assim, ambos os autores devem ser estudados. 34 DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. Trad. Estela dos Santos Abreu. 13 reimp. Rio de Janeiro: Contraponto, 2013. p. 31-32, grifos do autor. 103