Entrevista | Daniel Fassa | [email protected]
Por uma cultura do diálogo
de eco, para que Chiara também falasse, para que
ela explicasse melhor aquela experiência que ela
fez em 1949. Isso para nós era um tesouro: que
a mesma pessoa que fez uma experiência mística
explicasse no hoje da história aquela experiência
mística que ela fez e que continuava a fazer.
“O que une todo esse pluralismo,
essa maneira diferente de encarnar
o carisma da unidade? A fonte.
A fonte tem que ser a mesma”
A construção do conhecimento na modernida-
de e sobretudo após o Iluminismo ocorre mui-
tas vezes em contraposição à religião. Como
dentro da Escola Abba vocês tentaram articular
todas as ciências com a teologia, que se propõe
a responder outras questões, diferentes das
científicas? E como vocês procuraram justificar
isso dentro de um discurso acadêmico?
A teologia não era um referencial em relação
às outras disciplinas. Era uma das disciplinas.
O referencial era aquela experiência mística de
Chiara. E com isso nós recuperamos algo que a
modernidade perdeu, mas que na história da cul
tura é presente. Essa síntese, esse olhar global das
ciências sobre a realidade. Mesmo no ocidente, os
primeiros sociólogos se contaminavam com ou
tras disciplinas, com a história, com a psicologia e
até com a teologia. Por exemplo, Max Weber, que
é um grande nome da sociologia, tem todo um
estudo sobre a categoria carisma, que ele pegou da
teologia e estudou do ponto de vista sociológico.
Então não é que fizemos uma operação que não
tem nada a ver. Depois, se sairmos do horizonte
ocidental e entrarmos no horizonte asiático e afri
cano, isso para eles é normal.
Numa entrevista feita com o Axel Honneth,
professores da Social One introduziram o amor
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Cidade Nova | Janeiro 2018
ágape como categoria sociológica importan-
te para interpretar determinados fenômenos,
mas ele o tempo todo negou essa categoria,
justamente por considerá-la pouco universal,
muito enraizada no cristianismo. A pergunta
que fica é a seguinte: nós temos que esperar
que os outros aceitem essas categorias que são
particulares, por mais universais que nós as
consideremos? Ou nós temos que criar novas
categorias, outros conceitos, para conseguir
dialogar com essas pessoas?
Pode ser que o ágape, como categoria, tenha
esse problema, mas como realidade ele é univer
sal. Após a entrevista nós tivemos outros conta
tos com o Honneth e ele nos disse o seguinte:
‘se vocês me demonstrarem que pessoas que não
nasceram e viveram em um húmus cultural cris
tão vivem o ágape – não pensem o ágape, vivem
o ágape – eu estou disposto a rever a minha teo
ria’. Então para ele o importante não é que exis
ta a categoria na cabeça do povo, o importante
é que as pessoas vivam o ágape. E foi a partir
daí que nós começamos a fazer estudos de caso
em áreas culturais diferentes. E continuamos a
conversar com ele.
“Você cresce sempre,
nunca termina de crescer,
de amadurecer”
Há outros contatos em curso?
Sim. A Silvia Cataldi, atual responsável pela
Social One, antes de vir para cá [congresso do
grupo, realizado em Igarassu de 11 a 14 de dezem
bro], participou do Congresso da Associação La
tino-Americana de Sociologia, que aconteceu em
Montevidéu, com 10 mil pessoas. E ela foi convi
dada a apresentar esse nosso conceito. Foi muito
bem-recebida, houve muitas perguntas e muitos
professores querem participar do Congresso que
nós faremos no ano que vem, em Roma. Está se
alargando. O nosso livro já foi editado também
em inglês. Isso é uma coisa que não tem nem dez
anos e já está assim.