Quando são analisadas as famílias chefiadas por mulheres que recebem três salários ou mais, a presença das mulheres negras reduz para 29%. Em compensação, no Brasil as condições das mulheres negras contraria a tendência mundial de que elas vivem mais que os homens. Isso porque as negras são as maiores vítimas de feminicídio (61%, de acordo com o Ipea), revelando que, além de enfrentarem a vivência da solidão pela rejeição, são vitimizadas em grande escala pelos relacionamentos familiares e amorosos.
No caso das mães negras, o esforço é duplo: além de lidar com a própria solidão, elas precisam enfrentar a discriminação para com seus filhos. “Ainda a solidão da mulher negra está expressada quando esta tem sua cria expurgada da sociedade, vítima da violência e o Estado sequer escuta sua dor. Esses são apenas poucos olhares sobre a solidão da mulher negra existente, presente e latente em muitas sociedades. Direcionar o tema ao viés afetivo é importante, mas não deve ser um fator limitador. Afinal a solidão faz sangrar de diversas formas”, afirma Sazana Martins.
Em 2014, o Ministério da Saúde lançou a campanha SUS Sem Racismo, após o Relatório Socioeconômico da Mulher demonstrar que pessoas negras estão mais expostas a doenças e mortes que pessoas brancas.
Em 60% dos casos de mortalidade materna, as vítimas são mães e gestantes negras. 56% das gestantes negras afirmaram ter realizado menos consultas pré-natais do que as brancas. Além disso, enquanto quase 80% das mulheres brancas atendidas pelo SUS tiveram orientação a respeito da amamentação, contra apenas 62% das mulheres negras. Já as crianças negras estão entre o grupo com maior índice de mortalidade infantil. O Censo de 2010 do IBGE indicou que a mulher negra e parda, sem acesso à informação e a um bom atendimento de saúde, se torna mãe ainda adolescente e 52,89% delas são mães solos.
Há perspectivas de um futuro melhor?
A administradora Sazana Martins ainda pontua que essa mesma solidão invisibiliza a mulher negra em outros aspectos da sua vida, como profissional, financeiro e na criação dos filhos. “Diante de uma oportunidade de emprego lhe é negada a possibilidade de concorrer em pé de igualdade com outras mulheres apenas pelo fato dela não ter ‘boa aparência’. A solidão também está presente quando uma mulher negra encarcerada tem o direito de criar seus filhos menores suprimidos dela enquanto uma mulher branca, abastada, cumpre pena em prisão domiciliar por crime semelhante mas esta tem o direito à criação materna dos filhos menores garantido”.
Ela, que é ativista digital no combate contra o machismo e o racismo e realiza palestras em escolas da rede pública de Salvador sobre empoderamento negro, defende a necessidade de um debate profundo sobre o assunto. “Direcionar o tema ao viés afetivo é importante, mas não deve ser um fator limitador. Afinal a solidão faz sangrar de diversas formas”.
Quando questionada se vê uma perspectiva de melhora dessa cultura, a trancista gaúcha Jhozy Azeredo balança a cabeça negativamente e revela que acredita que essa é uma realidade ainda longe de ser totalmente modificada. Ela aposta na força que ganhou pelos anos de preconceito vividos, mas revela que o assunto ainda é delicado. “Eu acredito que a maioria das mulheres negras sofrem com depressão. Eu tive que fazer tratamento com psicóloga e psiquiatra, porque isso é uma coisa que veio lá da minha infância e me doía muito”.