Catálogo Cine FAP Segundo Semestre de 2016 | Page 13
Se a câmera, para ele, não é uma borboleta - voa aqui, voa acolá -, o movimento e o
tempo, na obra de Oliveira, são coisas muito diferentes e a incessante movimentação das
personagens é a ação que tanto o acusam de não ter. Mas a arte do cinema não foi feita para se olhar,
foi feita para se ver, embora poucos saibam ver como Oliveira o sabe. Quem o acompanhar não tem
descanso nem parança, como ele próprio a não teve desde os anos 80.
Agustina escreveu: “A turbulência das nossas reações humanas faz com que a solidão
nos escape e que o encontro com Manoel de Oliveira seja difícil. Queremos sujeitá-lo a um padrão
de vida, a uma seqüência de palpites sobre a história das pessoas que não se coadunam com a obra
dum artista como ele. (...) a sua personalidade única parece-me fazer parte da integral verdade da
criação.” Não sei dizer melhor.
Quer Oliveira se debruce sobre o mistério da mulher, quer interrogue a nossa história
- história do país em que nasceu, história da humanidade que inventou a arte - quer aborde as
relações entre a literatura, o teatro, a pintura e o cinema, o que predomina na sua obra singular é a
palavra visual, na sua própria expressão, a expressão que melhor me parece marcar a densidade do
que fez.
Para mim, a história da arte ou a arte da história nestes últimos dois séculos, em
Portugal, leva dois nomes: Pessoa e Oliveira. É esta a sua verdade, é esta a sua grandeza. Singular?
Singularíssima, como todas as obras que não têm paralelo com nenhuma outra.
Não a merecíamos. Mas tivemo-la e temo-la. E foi dita em português e foi vista de Portugal.
(Lisboa, 28 de Novembro de 2008)
Manoel de Oliveira e João Bénard da Costa