Catálogo Cine FAP Primeiro Semestre de 2017 | Página 4

Trechos de:“ Blood and black lace, de Mario Bava”, por Troy Howarth. Íntegra: http:// www. contracampo. com. br / 41 / bloodandblacklace. htm
Concebido inicialmente pelos co-financiadores da Alemanha Ocidental como um thriller policial de rotina, no modo de Edgar Wallace, Sei Donne per l’ Assassino representa um tremendo avanço no desenvolvimento do moderno filme de horror. É, de fato, indiscutivelmente o primeiríssimo slasher, embora esse rótulo diminua as conquistas de Bava por razões que se tornarão logo aparentes.
Neste filme, Bava retira a ênfase nas personagens e motivações psicológicas, criando desse modo uma literal sinfonia da violência em que ninguém é o que parece. No paranóico ambiente do filme, não se deve confiar em ninguém. Homens de negócio aparentemente respeitáveis revelam-se assassinos sádicos; todos os outros ou são seguros-de-si e intocáveis( por exemplo, o inspetor) ou traiçoeiros chantagistas. Desnecessário dizer que os espectadores em busca de um filme " pra cima " sobre pessoas felizes e maravilhosas não devem se arriscar. Bava usa sua câmera para que o público fisicamente tome parte na ação, sem encorajar contudo a simpatia do espectador com as personagens; por estas razões, muitos críticos continuam a vilipendiar Sei Donne, levando Bava a responder pela criação de uma celebração sem remorsos do sadismo.
[...] Executado com uma perspicácia mórbida e repleto dos deslumbrantes toques estilísticos que tiveram tão profunda influência em Dario Argento e Martin Scorsese, Sei Donne representa uma etapa lógica na maturidade crescente de Bava como cineasta. Os recursos um tanto limitados dos gêneros do gótico e do peplum deixaram o diretor ansioso por tentar algo novo. Embora La Ragazza che Sapeva Troppo( The Girl Who Knew too Much) tenha permitido que ele deixasse pra trás as armadilhas artificiais do filme de época, ele ainda sofre de certa falta de maturidade-- pode ser o primeiro giallo, mas é um giallo incerto. Em As Três Máscaras do Terror, o diretor deu um passo no sentido correto com o segmento " Il telefono "( seu segundo thriller com ambientação contemporânea), mas Sei Donne permanece o primeiro exemplo verdadeiramente sanguinolento do giallo. É um filme de tal crueldade sem remorsos e cinismo amargo que agitou o gênero em seus próprios fundamentos. Mesmo se não é o melhor thriller a sair da Itália( esta honra pertence a Prelúdio para Matar, 1975 de Dario Argento), é um exemplo compendioso do que fascina os conhecedores no trabalho de Bava, e do que outros consideram estar faltando, ou do que consideram simplesmente ofensivo.
[...] Em uma crítica bastante laudatória de Sei Donne( cf. FANGORIA # 100), Tim Lucas comenta o ponto de vista " maturamente misógino " do filme, embora não há qualquer maneira de negar que as personagens masculinas são apresentadas muito desfavoravelmente. Não há heróis neste filme, e Bava não incentiva o espectador a simpatizar com ninguém. O assassino vestido em negro, sua face escondida com uma escarfa de seda branca, representa o lado mal de todo homem. Ao contrário de posteriores " assassinos em série " como Freddy Krueger, o assassino de Bava é apresentado sem qualquer personalidade. Parte da razão que o gênero do slasher tem recebido tanta crítica negativa é que, intencionalmente ou não, poucos cineastas apresentaram seus assassinos como figuras heróicas que seguem punindo pessoas merecedoras que, de uma forma ou de outra, tenham quebrado os códigos morais da sociedade. Bava nunca comete este erro. Ao invés disso, ao provocar uma resposta estimulante do público durante as cenas do assassinato, Bava está encorajando o público não apenas a recuar e examinar seu próprio código moral, mas também a pensar no poder do visual. De um modo muito concreto, não-abstrato, Bava força o espectador a enxergar o incrível potencial do cinema de fazer mesmo os atos mais horripilantes parecerem perturbadoramente bonitos.